São Paulo, segunda-feira, 28 de fevereiro de 1994
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URV pode complicar salários e contratos

DA REPORTAGEM LOCAL

O governo enfrentará dois graves problemas após a introdução da URV (Unidade Real de Valor), que ainda estão sem uma solução à vista. São os casos dos salários e dos contratos pós-fixados.
A questão salarial, se for mal resolvida, poderá ter consequências inflacionárias. No caso dos contratos, o custo do plano do governo poderá pesar no bolso dos devedores. É o que afirma o ex-ministro da Fazenda e sócio da MCM Consultores, Mailson da Nóbrega.
"O salário mínimo ajustado muito acima da média poderá gerar um déficit grande para a Previdência. Além disso, haverá pressão inflacionária sobre a nova moeda por causa de despesas com empregados domésticos e condomínios, por exemplo", diz Mailson da Nobrega.
Quanto aos contratos, o ex-ministro lembra que a metodologia usada na apuração das taxas de inflação pode levar a "um conflito distributivo", onde a parte devedora do contrato sairá prejudicada.
"Sempre que há uma queda súbita da inflação no Brasil, os índices de preços só registram dois a três meses depois", diz Mailson. Isso ocorre por causa da metodologia, que carrega para o mês seguinte a aceleração inflacionária do mês presente.
Ou seja, quem tem uma dívida indexada pelo IGP-M, por exemplo, estará pagando o produto que comprou com base em uma taxa de inflação passada. "Em um período de transição, os contratos pós-fixados e as vendas a prazo poderão ter problemas", diz Mailson. Em um caso onde há venda a prazo na nova moeda, o "conflito distributivo" levaria a parte devedora do contrato a transferir renda à parte recebedora.
"A questão é complexa porque, se o governo intervir com vetor ou tablita, ele estará quebrando a promessa de não alterar os contratos na economia e também abrirá espaço para uma enxurrada de ações na Justiça", alerta Mailson da Nóbrega. Se a inflação não cair, "os trabalhadores poderão entrar na Justiça contra perdas salariais", afirma.
Se o governo não intervir, poderão acontecer dois outros desdobramentos. No primeiro, os devedores acabarão arcando com os custos do plano. No segundo, estes mesmos devedores também encontrarão na Justiça um meio de se proteger. "O Direito contempla a teoria da imprevisão", diz Mailson, segundo a qual um devedor não é obrigado a cumprir sua obrigação se houver desequilíbrio no contrato provocado por questões alheias a ele.
O ex-ministro da Fazenda afirma que o problema dos contratos poderão acontecer em vários níveis, como em relação aos títulos públicos federais pós-fixados indexados ao IGP-M, as Notas do Tesouro Nacional (NTNs). No setor privado, ele cita os contratos de leasing.

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