São Paulo, segunda-feira, 7 de março de 1994
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Fugazi vem nos dar aula de integridade em agosto

ANDRÉ FORASTIERI
ESPECIAL PARA A FOLHA

No segundo semestre, Belo Horizonte faz aniversário com um multievento que toca num lado que nos interessa: rock independente. De 11 a 14 de agosto a cidade sedia o primeiro festival independente do Brasil, com bandas brasileiras e gringas, workshops, seminários, papos com lojistas, distribuidores, selos etc.
Os caras são sérios na proposta. Tanto que selo ligado ou distribuído por gravadora grande não vale, só "indie" mesmo.
Tem muita gente sendo consultada e convidada para vir. Um dos caras mais importantes, talvez o mais importante, já topou. É Ian McKaye, líder do Fugazi. Essa banda de hardcore de Washington D. C. é bem boa. Mas o mais importante é que eles são ultra-independentes em todos os sentidos. Fazem questão de não entrar no "esquemão" seja qual for a grana envolvida.
O negócio deles é tocar seu próprio selo, o Dischord; fazer shows a preço de banana; e vender seus discos o mais barato possível. Nem merchandising eles topam. Tem uma camiseta famosa, pirata, com o texto "This is not a Fugazi T-Shirt".
Não vale a pena discutir se o Fugazi e a Dischord são inocentes nessa recusa. O que importa é que eles fazem o que dizem. Está cheio de cara com discurso bonito mas que na prática age de maneira bem diferente.
E eles estão todos pobres? Bom, dá para viver. Ninguém está nadando em grana. Mas coerência não é barato. E quando você tem a chance de fazer o que quer e ainda inspirar muita gente, ter um carro do ano deixa de ser prioritário.

CHEGA DE RPM
Inxs e Soul Asylum, sejam benvindos. Agora, esse negócio do RPM abrir o show dos caras é armação total. No Aeroanta o RPM toca para duzentas pessoas, agora vai tocar em estádio? Com que cacife? O RPM pegou aquela época e chega. A questão não é saber cantar, tocar, compor e se apresentar bem. Isso tudo o Paulo Ricardo sabe. Tem é que ter compostura. Roqueiro não pode tocar na Xuxa. E principalmente, não pode fazer anúncio de banco. Ponto final.

PÓS-CARNAVAL
Nem deu para reparar na festa mais brasileira de todas. Tive que trabalhar no Carnaval, é mole? No máximo vi umas travecas com cara de homem-elefante às duas da manhã. Mas deu para registrar uma coisa. Essa Simone Moreno –aquela que aparece muito rápido num anúncio animal de cerveja– tem tudo para emplacar. É linda, canta e dança superbem, segura um palco tranquila. E tem apelo para pegar todo tipo de público, de fã de samba à criançada e da MTV à sua mãe. Como outra baiana, Daniela Mercury. Com uma diferença: Simone é negra.
Vamos fazer um teste. Se Simone for eleita musa suprema da nação, isso aqui é uma democracia racial. Se ela vender menos da metade da Daniela, o Brasil é racista para caramba. Resultado em alguns meses.

SOUNDGARDEN
Enfim ouvido, digerido e agora comentado: é bom sim, vai sem medo que é rock'n'roll. Chris Cornell é meio cabecinha, o que poderia ter levado a banda para o caminho do mal agora que eles têm grana para jogar fora. Mas o resto da rapaziada não está lá só para fazer figuração. O resultado é setentão, com solos e aquela refrãozeira, mas raivoso. Tipo uma banda punk fazendo cover de Black Sabbath. Estão perdoados pelo show chatésimo que deram no Lollapalooza 92.

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