São Paulo, domingo, 13 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Perigo à vista

MARCOS CINTRA

"Se algo pode dar errado, é provável que dê", diz uma das "leis de Murphy". No Plano FHC esta máxima deve merecer a atenção das autoridades econômicas. Apesar de todo o cuidado na elaboração do programa, vários fatores podem conspirar contra seu sucesso.
Uma preocupação são as notícias, sem confirmação oficial, de que a execução orçamentária não está sob controle. Em fevereiro, o governo teve supresas desagradáveis e não divulgou o déficit de caixa do Tesouro. Como a consistência do plano depende do ajuste fiscal prévio, compromete-se a credibilidade de toda a estratégia.
É preciso, portanto, que a questão seja esclarecida. O problema pode se agravar em abril, quando o governo federal deverá pagar duas folhas de salários, com a antecipação do pagamento do dia 5 para o dia 30.
Outra fonte de incerteza está no comportamento dos agentes econômicos após o real. Espera-se uma inflação residual não-negligenciável. O arbitramento das perdas será desgastante para o governo. As perdas terão de ser definitivas, mas quem as aceitará passivamente?
A economia brasileira se assemelha ao do viciado em remédios. A qualquer sinal de dor, se entope de aspirina. No caso, mesmo que a inflação pós-real seja baixa, todos buscarão a indexação, com repasses a preços e a salários, o que poderá acelerar uma "reinflação".
Uma solução seria postergar a troca da moeda, aguardando a estabilização dos aumentos de preços em cruzeiros reais. Porém, os primeiros sinais vindos do setor produtivo indicam que a forma de conversão salarial estaria implicando aumentos reais das folhas de salários.
Neste caso, seria remota a possibilidade de uma rápida estabilização das taxas inflacionárias e o governo necessita de resultados rápidos para atender seus objetivos políticos.
Finalmente, constata-se o emperramento das reformas institucionais. O processo de revisão das reformas econômicas parece que vai fracassar.
Sem elas, a base de sustentação do plano desmorona, as expectativas de estabilização se revertem e o projeto pode desandar muito mais rápido, apesar de sua correta formulação.

Texto Anterior: Ameaça é tática errada contra a inflação
Próximo Texto: À memória do economista Ignácio Rangel
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.