São Paulo, domingo, 13 de março de 1994
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Laterais buscam a consagração na Copa

MARCELO DAMATO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os laterais estão tomando conta do futebol. Empurrados para a perfeição tática, técnica e física pela evolução do esporte, assumem um papel cada vez maior nos times e seleções. Cada vez mais, também, jogadores dessa posição são deslocados para posições na faixa central do gramado, barrando os ocupantes tradicionais dessas posições.
"Hoje, os laterais representam para o futebol o que representavam os meias no passado", afirma o técnico do São Paulo, Telê Santana. "Eles são os organizadores das jogadas do time." "Esse fenômeno vem surgindo aos poucos, mas será mais forte nesta Copa", afirma o francês Henri Michel, técnico da seleção de Camarões.
Para Telê, os laterais modernos precisam reunir velocidade, desempenho físico e habilidade técnica. "Eles têm que ser defensores, jogadores de meio e, em certos momentos, pontas."
Isso significa que esses jogadores precisam marcar, passar e chutar com precisão, saber "ler" o jogo e ainda ter resistência física acima da média dos outros jogadores.
O maior exemplo desse modelo é Cafu. Ele tem provavelmente o maior limiar anaeróbico (velocidade máxima sem déficit de oxigênio, 18 km/h) de todos os jogadores em evidência do país. Fez sucesso na lateral e foi o artilheiro do São Paulo no Campeonato Paulista, jogando no meio.
Cafu já mudou tantas vezes que nem sabe mais qual é a sua posição. "Quando jogo de meia, sou meia, quando jogo como lateral, sou lateral", costuma dizer.
Cafu não é o único caso assim entre os laterais da seleção de Carlos Alberto Parreira. Mesmo repetindo que não gosta de improvisar jogadores fora de sua posição, Parreira, de fato, só chamou para ocupar essa faixa de campo nas eliminatórias jogadores que despontaram na lateral, mas que hoje jogam pelo menos tanto no meio quanto na beira do gramado.
Jorginho, o titular da direita, tem dividido seu tempo na Alemanha entre a lateral e a posição de volante no Bayern de Munique. Branco, o camisa 6 de Parreira, voltou ao Fluminense no meio-campo, posição em que jogou na Itália. Seu provável reserva, Leonardo, ex-lateral de Flamengo, São Paulo e Valencia, é desde o ano passado o meia-esquerda do São Paulo. Neste período, só uma vez foi "improvisado" na lateral esquerda, contra a Ferroviária (vitória de 4 a 0), neste Campeonato Paulista.
Telê discorda, porém, de que quando um lateral se destaca por sua técnica, ele deva ser deslocado para o meio: "Às vezes, eles são mais úteis na lateral, mesmo."
Ele cita como exemplo o próprio Cafu. "Quando eu cheguei ao São Paulo, percebi que o Cafu, que jogava como volante, renderia mais como lateral. No Campeonato Paulista de 93, ele se machucou e o Vítor foi muito bem e ganhou a posição. Quando o Cafu se recuperou, ele ficou um tempo no banco e depois foi aproveitado na meia."
O treinador diz que, às vezes, a idade pode pesar no deslocamento de um lateral para o meio. "Quando o jogador fica mais velho, perde um pouco da condição física e daí pode se tornar conveniente que ele passe a jogar no meio."
Sinal dos tempos. Até menos de 20 anos atrás, o Brasil estava acostumado a ver laterais veteranos encerrarem suas carreiras como zagueiros, como Carlos Alberto Torres, Rodrigues Neto e Orlando. Ironicamente, há um quê de volta ao passado na modernidade dos laterais. Na década de 30, os times jogavam com dois zagueiros, três meias ("halfs") e cinco atacantes. Os "halfs" direito e esquerdo foram os precursores dos laterais. A semelhança só vai até aí. Argemiro e Zezé Procópio, por exemplo, que jogaram a Copa de 38, eram exemplares apenas como marcadores.
No Brasil, o pioneiro no apoio foi Nilton Santos (bicampeão mundial em 58 e 62), um dos expoentes da lateral esquerda em todos os tempos. Nos anos 70, surgiram laterais que atacavam tanto quanto defendiam, como Marinho Chagas, Breitner e Júnior. Depois veio a fase do overlaping e, hoje, vive-se a era dos alas, criados pela Dinamarca em 1986.
"O futuro do futebol é todos os jogadores se tornarem tão versáteis como os alas. Os zagueiros vão precisar ter inteligência e talento para subir ao ataque e o ideal é algo próximo à Holanda de 74. Um time em que todos saibam atacar e defender bem e executar a função correspondente ao local do campo em que estiverem", conclui Telê.

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