São Paulo, domingo, 13 de março de 1994
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Liga Norte ataca seu 'aliado' Berlusconi

MARIE-CLAUDE DECAMPS
DO "LE MONDE", EM ROMA

A aliança dos partidos de centro-direita da Itália, armada para tentar bater os ex-comunistas do Partido Democrático da Esquerda (PDS) nas eleições de 27 e 28 de março, dá sinais de esgotamento. Até agora, o casamento entre Umberto Bossi, chefe da autonomista Liga Norte, com o magnata das comunicações Silvio Berlusconi, idealizador da Força Itália, havia conseguido manter as aparências de uma situação conjugal tempestuosa, na qual cada um procura fazer sua família aceitar a contragosto o }casamento desigual.
Berlusconi explicava que "era Bossi que havia feito o melhor negócio. O trovejante Bossi, de mangas arregaçadas e gestos ambíguos, declarava segurar seu aliado pela cauda, como um gato, e que este faria bem em não se mexer um passo, }pois a Liga possui um fuzil de dois canos: uma bala para os inimigos, outra para os amigos que traírem. Enquanto isso não acontecia, aconselhava seus militantes: }Tampem o nariz e votem pela Força Itália onde for preciso para bloquear os comunistas.
Em outras palavras, uma brincadeira era jogada há várias semanas no Pólo da Liberdade (a aliança de direita), brincadeira esta em que os dois parceiros se criticavam publicamente para arrebanhar votos em nome de um anti-comunismo, mais que aleatório no momento em que o PDS (ex-Partido Comunista Italiano) se ergue em defesa das privatizações e da Otan. Sobretudo num momento em que as sondagens indicam que a esquerda se mantém estável, enquanto a direita cresce às custas do centro.
Mas as sondagens transformaram esta pequena comédia em confronto. O que emerge delas é que, se a Força Itália passou de 11% das intenções de voto para 27%, entre janeiro e março, a Liga, que desde setembro já havia caído de 19% para 13%, agora tem só 8%.
Pior ainda para o orgulho de Bossi: o terceiro parceiro, o neofascista MSI, ao qual Berlusconi foi a contragosto autorizado a se aliar (especialmente no centro e sul do país), ultrapassou a Liga, mantendo-se nos 10%. Isso significa que o gato metafórico que Bossi acredita estar segurando firmemente pela cauda, longe de neutralizado, está devorando sua mão.
Analistas políticos se perguntam qual será a razão da queda da Liga. Será a diminuição dos protestos anticorrupção, muito aproveitados por Bossi? Será a nova identificação populista da Força Itália, que não promete apenas o }federalismo fiscal, mas }uma redução dos impostos em um terço –e isso sem aventar o argumento }faca de dois gumes da divisão do país?
A Liga está percebendo que no Pólo da Liberdade ela se tornou prisioneira, condenada à aliança. Ela dá conta –em vista das últimas eleições municipais em que não conseguiu obter acesso ao mar, como diziam os comentaristas– de que sua influência não é exportável para fora do Norte, sobretudo da Lombardia.
Resultado: o tom se acirrou ainda mais. Berlusconi aperfeiçoa sua imagem nas televisões estrangeiras, explicando que a direita fez }uma aliança que se mantém por milagre e que ele fez todo o possível para se }manter à distância. Já Bossi, furioso, denuncia as sondagens como }fraudes vergonhosas, trata seus aliados de }reciclados da Falsa Itália (trocadilho com Força Itália) e seu chefe de }verme servil do velho regime. }Veremos, disse ele, }como ele (Berlusconi) se comportará quando ameaçarmos suas televisões –ele, o ultraliberal...
Para concluir, num toque final, Umberto Bossi redigiu um texto confidencial, mas que, como sempre acontece na Itália, foi divulgado com destaque pela imprensa. Esse texto, datado de 3 de março e dirigido a todos os secretários de seções de seu movimento, exigia inequivocamente que não fizessem campanha pelos candidatos da Força Itália.

Tradução de Clara Allain

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