São Paulo, quarta-feira, 16 de março de 1994
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Salário pelo pico fere lógica do Plano FHC

GABRIEL J. DE CARVALHO
DA REDAÇÃO

A intransigência do governo nas negociações sobre os salários tem uma explicação: a conversão pelo pico, como querem as lideranças sindicais, destruiria de imediato o Plano FHC. O corre-corre de preços e salários seria transferido para a URV e, consequentemente, para a nova moeda que se quer criar.
As centrais sindicais alegam, com toda razão, que a inflação é um processo injusto, que achata os salários. Para ser justo, o plano deveria devolver aos salários o poder aquisitivo que tinham no mês da data-base, o denominado pico.
O governo não discorda que a inflação prejudica mais os trabalhadores que as empresas, os rentistas e os bancos. Seu plano, porém, parte do pressuposto de que esta é uma realidade impossível de ser alterada por decreto.
A conversão de salários, preços e contratos para a URV significa dar à correria desses fatores um ritmo-padrão. O plano não pretende alterar as posições dos "corredores". Isso vem mais tarde. Com toda a economia numa velocidade parecida, a da URV, faz-se a conversão para a nova moeda e o índice de inflação desaba.
Na última data-base, todas as categorias fizeram seus acordos sabendo que a inflação achataria os salários reais nos meses seguintes. Sindicatos fortes, como os dos metalúrgicos do ABCD e São Paulo, conseguiram reajustes integrais pela inflação passada, amenizando as perdas. Outros, mais fracos, aceitaram com adaptações as regras da política oficial.
A conversão pela média não impõe novas perdas, pelo menos na fase da URV. Simplesmente evita que elas se ampliem, caso a inflação se acelere. No governo Sarney a inflação tocou nos 80% e, mesmo com reajuste integral, as perdas chegaram a 44,45% em um único mês. Converter todos os salários compulsoriamente pelo pico significa alterar as posições dos "corredores" na pista da inflação. Seria a tentativa de apagar, por decreto, toda a realidade dos últimos meses, anos.
As empresas buscariam recompor suas margens. O corre-corre de preços e salários, antes em cruzeiros reais, seria restabelecido em URV. A fase da nova moeda não sairia do papel. O país viveria um processo típico de hiperinflação.
Se é para ser assim, o plano não seria de estabilização, mas de desestabilização.

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