São Paulo, sexta-feira, 1 de abril de 1994
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Livro conta histórias de crianças trabalhadoras

DA REPORTAGEM LOCAL

Crianças de três anos colhem tomates. Outras, um pouco mais velhas, trabalham em carvoarias. Em todo o país, elas são mão-de-obra ativa também em fábricas de sapato, canaviais e pedreiras.
Suas histórias foram registradas em fotos e entrevistas por duas jornalistas que percorreram vários Estados brasileiros em nove meses.
O trabalho teve apoio da OIT (Organização Internacional para o Trabalho), da ONU, e da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e vai virar o livro "Crianças de Fibra", ainda sem data para publicação.
O objetivo do trabalho é mostrar histórias individuais que ilustram as informações já coletadas em pesquisas estatísticas.
"É diferente dizer que 50% das crianças com menos de 14 anos trabalham e mostrar quem são essas crianças e como elas vivem", diz Jô Azevedo, 41.
Iolanda Huzak, 46, fotografou as crianças. "Há cenas em que parece que eles estão brincando quando, na verdade, complementam a renda familiar", diz.
As duas são unânimes ao apontar um dos piores lugares onde há trabalho infantil: as carvoarias no interior do Mato Grosso do Sul.
Como exemplo, elas citam a história de Sérgio, 7 anos. Ele foi para a carvoaria com o pai e a mãe.
Há cerca de seis meses, o pai de Sérgio abandonou a família. Antes, esfaqueou a mãe, que ficou impossibilitada de trabalhar. Ele foi a única força de trabalho que sobrou. "Ele assumiu a postura de chefe da família", diz Jô.
Além do Mato Grosso do Sul, elas visitaram o Ceará, Salvador e Petrolina na Bahia, a cidade de Campos, no Rio de Janeiro, Recife, em Pernambuco, Porto Alegre, e Franca e Araraquara, em São Paulo.
Em cada um desses locais, diferentes situações de trabalho arricado foram encontrados. "Encontramos crianças britando pedras em Fortaleza, adolescentes respirando o odor de cola de sapateiro nas fábricas de calçados no interior de São Paulo, outras trabalhando de 4h às 18h, com 30 minutos para o almoço", dizem.
"Crianças e adolescentes com menos de 18 anos não podem trabalhar senão como aprendizes e em condições especiais", explica Iolanda.
Segundo as jornalistas, as famílias encaram o trabalho dos filhos como algo bom. "Os pais trabalham desde crianças, foram criados assim e é isso que eles ensinam aos filhos", diz Iolanda.
Um dos aspectos ressaltados pelas duas são os riscos que o trabalho traz para crianças. Uma sessão de fotos mostra mãos com cicatrizes e até mutilações em decorrência de acidentes de trabalho.
"Em algumas lavouras, como cenoura e tomate, que são plantações rasteiras e exigem mãos pequenas, as pessoas chegam a dizer que o trabalho foi feito para a criança", afirma Iolanda.

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