São Paulo, domingo, 10 de abril de 1994
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Escândalo à brasileira

JANIO DE FREITAS

Das listas do bicho emerge um mistério político-contábil. Os bicheiros sempre foram grandes patrocinadores financeiros, senão os maiores, de candidatos do PFL, muitos deles agora no PPR. É improvável que políticos federais de outros partidos tenham sido mais beneficiados pelos bicheiros do que aqueles. Nenhum apareceu entre os denunciados, porém.
Mistério de outra natureza envolve o suposto sujeito que, supostamente, deu à juiza Frossard a suposta pista para chegar à contabilidade de Castor de Andrade. Desde o primeiro momento do escândalo, as autoridades do caso diziam que o guardavam sob proteção, no que seria uma dependência da PM. De repente, é dado como de paradeiro desconhecido, comunicando-se com as autoridades apenas por intermediários. Existe, ao menos?
Sem mistérios, porque explicáveis já por suas autorias, são os episódios gaiatos que não poderiam faltar ao escândalo. Citado, Maluf investiu contra o procurador-geral Antonio Carlos Biscaia: "É um pirralho! É um moleque!" Não sabe, é o que se pode deduzir, o significado de pirralho. Queria ofender e acabou retirando até de moleque o teor ofensivo, porque a primeira palavra realçou-lhe o sentido, também, de criança.
Marcello Alencar, candidato do PSDB ao governo fluminense, quis dar uma de esperto e, na tarde de quinta-feira, foi acompanhado de repórteres ao governador Nilo Batista propor que pedisse intervenção federal no Rio: "As denúncias de Biscaia são gravíssimas!" Duas horas depois, estava entre os novos denunciados pelo procurador-geral como agraciado pelos bicheiros. Mudou depressa (e tarde): "O Maluf tem razão quando chama o Biscaia de moleque. Esse procurador é um irresponsável, está fazendo denúncias mentirosas".
É um escândalo brasileiro, sem dúvida.
Mais um passo
Os peessedebistas que se aborrecem ao se verem como aliados do PFL ainda estão vendo pouco. Sendo o primeiro passo a véspera do segundo, Fernando Henrique está agora interessado em aliança com Paulo Maluf. A primeira conversa dos dois, neste sentido, já aconteceu nesta semana. A ela se atribui que a empolgação do senador Esperidião Amin com sua candidatura pelo PPR, em lugar de Maluf, fosse substituída por repentino retorno ao tema estadual. Em Santa Catarina, Esperidião tem mais de 60% das preferências para governador.
Para quem aceite a tese de que a uma candidatura só importa a aritmética dos votos, a iniciativa de Fernando Henrique é duplamente lógica. Além do apoio partidário a mais, com óbvio valor em São Paulo, afasta um inconveniente inesperado: Esperidião Amin. Inteligente, de sagacidade política incomum nas gerações políticas mais novas, determinado e ativo, Amin pode ser uma presença interessante na disputa sucessória. Tem a credencial do êxito administrativo como governador e, com sua rara habilidade para falar tanto às elites como ao povo, é capaz de tirar votos de todos os outros candidatos. Para Fernando Henrique, Maluf teria sido competidor mais conveniente do que Amin.
Contra a eficiência
O grande êxito do governo Itamar Franco é a Receita Federal dirigida por Osiris Lopes Filho. Velho funcionário da Receita, Osiris tem o saber da experiência. Professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília, tem o saber teórico. A integridade pessoal, que investigações promovidas por empresários paulistas não puderam negar, completa-lhe a autoridade para a função. Com estes atributos, Osiris Lopes Filho fez um plano de reorganização da Receita, sem acréscimo de gastos e Fernando Henrique deixou-o aprovado.
Osiris Lopes Filho está na iminência de se demitir da Receita: o secretário-executivo da Fazenda, o engenheiro paulista Clóvis Carvalho, engavetou o projeto e saiu buscando apoios para o seu ato. Mesmo que não tenha êxito, já tem a gratidão do grande empresariado de São Paulo e de uma centena de outros afortunados que estão passando por apertos da Receita em outros Estados. São pessoas que sabem ser reconhecidas. Como Clóvis Carvalho, pode-se acreditar, também é agradecido a Fernando Henrique por levá-lo para a Fazenda.

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