São Paulo, quinta-feira, 14 de abril de 1994
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Polarização

Disseminam-se dentro do PSDB os focos de rebeldia contra uma eventual aliança com o PFL. Segundo esta Folha informou ontem, já há sinais de oposição a esse acordo, incluindo ameaças de defecção para outras candidaturas, em pelo menos 11 Estados e na capital federal.
Do ponto de vista interno, partidário, essas manifestações vêm escancarar a magnitude da descaracterização que um enlace com o PFL significaria para o PSDB. O PFL, de fato, simboliza práticas políticas das quais o PSDB buscou dissociar sua imagem desde a sua criação.
Sob um prisma político mais amplo, porém, as ameaças de defecção no PSDB começam a esboçar um cenário para a corrida presidencial que, por mais paradoxal que hoje pareça, pode ao mesmo tempo abalar os partidos atuais e acabar provocando a disputa eleitoral programaticamente mais consistente que o país já conheceu.
Com efeito, as últimas pesquisas realizadas pelo Datafolha colocam Lula e Fernando Henrique Cardoso como os candidatos hoje com maiores condições de chegar ao segundo turno. Mais do que uma escolha entre o PT e o PSDB, esse confronto ofereceria ao restante dos atores políticos e, mais importante, ao eleitorado uma opção entre ideologias, plataformas, visões de Estado e sociedade nitidamente definidas e distintas entre si.
Muito mais do que Fernando Collor, que usava teses liberais como parte de um elaborado esquema de sedução e logro, Fernando Henrique Cardoso, se confirmar-se a polarização com Lula, será o candidato natural de todos quantos defendem um Estado mais restrito e uma economia baseada no livre mercado. De outro lado, o postulante petista evidentemente congregará aqueles que preferem um Estado que intervenha mais pesadamente na organização econômica e social. Acima das legendas envolvidas, essas teses podem ser os determinantes na definição do apoio e voto.
É claro que existem incontáveis –e relevantes– gradações entre tais extremos, mas em grandes linhas essa tenderá a ser a opção de rumo colocada ao país. Não é difícil imaginar, em tal contexto, para onde os grupos conservadores preferirão ir, arrastando consigo o pesado ranço de sua deplorável tradição política. Restaria saber se o PSDB, como existe hoje, pode sobreviver a uma aliança eleitoral com as forças que sempre condenou.

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