São Paulo, domingo, 17 de abril de 1994 |
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Os dilemas do real
LUÍS NASSIF Há algumas complicações adicionais no caminho do real. A primeira delas é a demora da inflação em se estabilizar.Os autores do plano supunham que o anúncio da URV provocaria a eclosão de alguns movimentos especulativos. Passado o susto inicial, haveria a estabilização da inflação, ainda que em patamar superior. Essa estabilização significaria que a estrutura de preços estaria novamente alinhada, com os preços relativamente estáveis em URV. A passagem para o real se daria, então, sem uma inflação residual muito expressiva. Ocorre que esse equilíbrio ainda não foi atingido. Em outros momentos, sempre que a inflação dava um salto, provocava uma queda de vendas, pela perda de poder aquisitivo dos salários, em função da lei salarial em vigor. A inflação se estabilizava em um patamar superior, até que a recomposição salarial provocasse novamente uma recomposição de demanda, sancionando nova elevação dos preços. Ao conceder reajustes mensais em URV para os salários, o governo interrompeu esta lógica. Agora, a aceleração da inflação provoca uma perda salarial, mas em ritmo muito inferior ao do velho modelo, porque decorrente exclusivamente da desvalorização do dinheiro após o recebimento do salário –até o dia do recebimento, a URV garante a recomposição quase integral do seu valor. Nos próximos dias, a equipe econômica vai se deparar com a questão incômoda: ou aguarda mais ainda para implantar o real, ou implanta o real o mais rapidamente possível. É uma aposta complexa. No primeiro caso, pode ser que esse equilíbrio seja alcançado mais à frente. Mas, pode ser que não se alcance nunca e que, a cada salto da inflação, mais se amplie a dispersão dos preços relativos e maior seja a tendência de inflação residual pós-real. No segundo caso, com a inflação em cruzeiros se acelerando, implantando a nova moeda seguramente haverá uma inflação inicial em real maior do que a prudência recomendaria –principalmente levando-se em conta a fixação do câmbio. Além disso, antecipando o real, o governo terá que arbitrar contratos que ainda não foram convertidos para o novo índice –uma provação da qual ele pensava livrar-se esticando o máximo possível o prazo de implantação do real. O problema fiscal Mas não é o único problema imediato do real. Há sinais de queda da arrecadação fiscal. As explicações para a queda podem estar num erro da própria Receita. Na ponta do Imposto de Renda pessoa física a Receita determinou que os valores recebidos no mês deveriam ser convertidos em URV na data do efetivo pagamento e, depois, reconvertidos em cruzeiros pela URV do início do mês. Ganha o contribuinte e perde a Receita. Suponha um contribuinte que tenha recebido CR$ 1,2 milhão no dia 15. Pelo sistema adotado pela Receita, supondo uma inflação de 45% ao mês, em vez de recolher imposto sobre CR$ 1,2 milhão, ele passou a recolher sobre CR$ 1 milhão. Além disso, nos contratos em cruzeiros reais, o IPI acaba incidindo sobre o custo financeiro nas vendas a prazo. Um produto de CR$ 1 milhão, vendido a 30 dias, embutia um custo financeiro de CR$ 450 mil. O IPI incidia sobre CR$ 1.450 mil, pagos antecipadamente. Agora, a empresa converte CR$ 1 milhão pela URV do dia do pedido. No dia do pagamento, recebe os mesmos CR$ 1.450 mil (decorrentes da correção da URV no período). Mas o IPI incide apenas sobre CR$ 1 milhão. Texto Anterior: FAZER A COISA CERTA Próximo Texto: Saiba o que pode ser deduzido no livro-caixa Índice |
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