São Paulo, domingo, 17 de abril de 1994
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'Nove, Novena' é inspirado em vitrais religiosos

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Publicado em 66, "Nove, Novena" foi o primeiro passo da prosa de Osman Lins em direção a uma narrativa polifônica que ia culminar em "Avalovara" (1973).
"A primeira fase, até 'O Fiel e a Pedra', é de enfoque mais psicológico, mais próximo da narrativa direta. Para Osman Lins, o homem tem que se definir com H maiúsculo. Essa primeira fase está ligada a uma idéia da dignidade humana. Com 'Nove, Novena' se abre uma outra fase. Isso não quer dizer que seja mais importante. Há uma nova preocupação. Mas é ainda o mesmo projeto, que ele vai aprofundando de livro para livro", diz José Paulo Paes, que foi um dos amigos mais próximos do escritor.
São nove narrativas –o próprio autor recusava a classificação dessas histórias como contos–, com diversos pontos de vista que formam um quebra-cabeça, uma espécie de mosaico.
"São mini-romances. Não são contos. Para você avançar em literatura, você tem que ir além das formas existentes. Mas precisa saber que elas existem para poder violá-las", diz Paes.
"O que o impressionou muito quando morou na Europa, em 1960, foram as figuras do século 13. Figuras de cabeça grande, olhos grandes, de frente. São as figuras dos vitrais. Ele queria conseguir alcançar em literatura uma prosa em que as figuras estivessem todas de frente. Sempre no presente. E que fossem fragmentos, como nos vitrais, fragmentos que formassem essas figuras", diz Julieta de Godoy Ladeira.
É no "Retábulo de Santa Joana Carolina", considerado o principal texto da coletânea e que terminou dando título ao livro na elogiada tradução francesa (ed. Denoel), que esse procedimento tem sua forma mais acabada.
Numa viagem a Barcelona posterior à publicação, Osman Lins e Julieta Godoy se depararam com uma sala de retábulos (nichos com ornamentos religiosos em igrejas) dos séculos 13 e 14 no museu de Arte Românica. "Ele ficou no meio da sala e disse: 'Estou no meio da minha obra'. Ele achava que nessa época a arte era mais pura. Depois começou a tomar um certo maneirismo", diz Godoy.
Em "Nove, Novena", o escritor também dá início ao uso de sinais, prática que seria radicalizada em "Avalovara" (leia texto ao lado). São figuras geométricas que marcam o início de parágrafos, identificando a origem daquela voz, quem é o personagem.(BeC)

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