São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 1994
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CVM resiste a projeto da Gazeta Mercantil

FREDERICO VASCONCELOS
EDITOR DO PAINEL S/A

O maior jornal de economia e negócios do país, a "Gazeta Mercantil", enfrenta dificuldades financeiras e parte para um negócio controvertido.
A empresa que edita o jornal prepara-se para abrir o capital, de olho em US$ 23 milhões que virão de um "pool" de fundos de pensão de estatais.
Até então uma companhia fechada e pouco transparente, a Gazeta Mercantil S/A já enfrenta os primeiros desafios para atuar num mercado aberto.
O pedido de registro como empresa aberta encontra resistências nos órgãos técnicos da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
A empresa alega que são apenas divergências sobre aspectos contábeis.
Com a ajuda da Abrapp -Associação Brasileira das Entidades de Previdência Privada, a Gazeta Mercantil contactou grandes fundos de pensão de estatais.
O projeto foi apresentado, por exemplo, à Previ (Banco do Brasil), Sistel (Telebrás), Telos (Embratel) e Petrus (Petrobrás). Apenas um plano privado (Philips) está envolvido nessa fase inicial.
Os administradores dos fundos de pensão -cujas reservas têm origem, em sua grande maioria, em recursos públicos- evitam comentar o investimento num setor de rentabilidade reduzida.
Uma exceção foi a Previ, cujo diretor, Francisco Valderrama Jr., vê no negócio "uma operação de saneamento que proporcionará novos investimentos para a empresa, que se tornará rentável".
"Nosso projeto foi aprovado por todos os departamentos técnicos dos grandes fundos de pensão, por sua viabilidade e pelo retorno do dinheiro a médio e longo prazos", diz Luiz Fernando Levy, presidente da Gazeta Mercantil.
Levy tem o respaldo do advogado Ary Oswaldo Mattos Filho, ex-presidente da CVM, que orientou a empresa na operação.
Outro ex-presidente da CVM, Roberto Teixeira da Costa, concorda com Mattos Filho, e diz que a CVM não tem que entrar no mérito de valores.
Compete à CVM, porém, proteger os interesses dos investidores e zelar para que as informações estejam de acordo com a lei e com os chamados "princípios de contabilidade geralmente aceitos".
O balanço mais recente (de 1993) foi considerado "maquiado" na opinião de dois especialistas consultados pela Folha.
Surpreendeu o elevado valor contabilizado como "reserva de reavaliação", que chega a superar o total do patrimônio líquido.
Esse expediente "engorda" o balanço, compromete a avaliação dos índices de desempenho e evita que seja reconhecida uma eventual situação de patrimônio negativo.
Ainda assim, o balanço retrata o perfil de uma empresa deficiente. O endividamento aumentou em relação ao exercício anterior.
As projeções da Gazeta Mercantil -com base em estudo da firma de consultoria Ernst & Young– foram consideradas, pelos analistas consultados pela Folha, excessivamente otimistas e inconsistentes com a evolução da empresa.
O estudo projeta o crescimento de receita de 23,5% em 93/94, com base no esforço de vendas para recuperação de mercado, introdução de novos produtos e aumento do número de assinantes.
Foi adiado para setembro o projeto de uma "Sexta Edição" (de fim-de-semana). Ela estava prevista no estudo para ser lançada em janeiro último e deveria gerar US$ 60 milhões anuais em anúncios.
Há divergências sobre os critérios para capitalizar a marca da empresa. O valor atribuído no balanço a "marcas e patentes" é mais de 13 vezes superior ao das "máquinas e equipamentos".
"A marca tem um valor de negócio. A dúvida é como ele deve aparecer no balanço", diz Mattos Filho. "O que a CVM tem que fazer é dar transparência, a análise do investimento é uma tarefa do investidor"', diz.
Um "pool" de 40 instituições financeiras -lideradas pelo Bradesco e Itaú- aguarda apenas a aprovação da CVM. Já está pronto o edital para dar início à operação.
A Abrapp não respondeu aos pedidos da Folha para comentar sua participação nessa operação.

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