São Paulo, domingo, 15 de maio de 1994
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Politiquices contra politiqueiros

LUÍS NASSIF

A atual onda de greves comandada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) tem propósitos eminentemente políticos.
Visa torpedear a candidatura Fernando Henrique Cardoso às vésperas do anúncio do real. O que seria bem-feito –dado que FHC sacrificou todas as propostas de reformas por um plano eleitoreiro– não fosse o fato de que manipula-se, de lado a lado, o bem estar dos cidadãos.
Logo que foi anunciada a URV, a Força Sindical saiu afoita atrás de uma greve, visando capitalizar o que imaginava ser uma reação geral fulminante contra o plano. Deu com a cara na porta.
De início, a CUT manteve uma posição mais cautelosa. Em reunião fechada, com o Dieese, chegou-se à conclusão que o plano não provocaria perdas salariais.
O próprio Sindicato dos Matelúrgicos de São Bernardo, ao qual pertence o presidente da CUT, Jair Meneguelli, constatou que suas perdas não passavam de 3% –mera diferença estatística.
Desculpa esfarrapada
Depois, a CUT tentou elaborar um álibi meio desengonçado para justificar a ofensiva contra o plano. Seria um protesto pelo fato de ele não prever medidas desenvolvimentistas e quetais. Poderia ser também o fato do pai do Fernando Henrique chamar-se Leônidas. Valia qualquer desculpa.
Se a questão fosse a falta de enfoques desenvolvimentistas do plano, no mínimo as manifestações deveriam vir acompanhadas de propostas concretas. Por exemplo, exigir a retomada das câmaras setoriais, a reforma na legislação trabalhista, a redução dos impostos sobre a produção e sobre a folha salarial.
Mas, não. A CUT comporta-se da mesma maneira irresponsável dos políticos tradicionais, de todos esses velhacos que subordinam o bem-estar social e os direitos dos cidadãos às suas propostas de conquista do Estado.
Toda esta máquina político-institucional –do qual o modelo sindical é peça relevante– não vale nada, quando entram em jogo os interesses da cidadania.
Exploradores
Para todos esses safos –dos homens de FHC aos xiitas de Lula na CUT–, a população, o cidadão-contribuinte não passa de um detalhe do jogo político, necessário, porque paga as contas, porém desagradável.
As greves não visaram exigir do poder público serviços mais eficientes para os cidadãos, redução do nível de corrupção e de vagabundagem de muitos desses setores, o fim das indicações políticas, o fim dos aumentos de tarifas e de preços, a definição de metas de produtividade que permitissem aumentar salários sem aumentar tarifas. Nada disso.
As greves visaram exclusivamente torpedear uma candidatura rival, de maneira a permitir que Lula, sendo eleito garanta a ampliação dos privilégios das corporações públicas e privadas –contra os direitos dos contribuintes.
Na hora em que se necessitou do aval da CUT para se permitir que os rombos do FGTS fossem quitados com ações de estatais, não se viu um gesto da entidade em defesa dos interesses da maioria. Simplesmente porque significaria subordinar as estatais ao interesse do conjunto da população.
Do lado de cá do balcão tem cidadãos, trabalhadores que financiam o Estado, que consomem serviços públicos e privados, que não recebem privilégios da máquina sindical nem da estatal, que nem sequer têm direito aos serviços pelos quais paga honesta e religiosamente.
Este cidadão politicamente não-organizado é a peça central de qualquer montagem de Estado. E é uma vítima tanto dos coronéis nordestinos quanto dos marajás sindicais.

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