São Paulo, domingo, 3 de julho de 1994
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Melhor a classe, ou a sociedade?

BEATRIZ DE LIMA PEREIRA

A Constituição quis fortalecer os sindicatos, com liberdade para a defesa de direitos e interesses coletivos ou individuais das categorias. O Estado teve o poder limitado com o fim da outorga de cartas sindicais. Se não é a situação ideal, inegável o avanço.
Esperava-se e ainda se espera o aperfeiçoamento da atuação sindical, pois o agrupamento espontâneo de trabalhadores e empresários ligitima as entidades para o seu papel institucional.
Nessa perspectiva, o embate entre capital e trabalho não pode ficar somente nos limites da tutela estatal. Hoje, todos os conflitos trabalhistas, individuais ou coletivos, desaguam na Justiça do Trabalho.
O desequilíbrio social, a crise econômica e a inexistência de mecanismos de auto-composição fazem com que essa Justiça, inspirada na celeridade e na informalidade, esteja atolada em processos que demoram anos para terminar.
É preciso estimular a autocomposição. É ilógico promover a liberdade sindical e atribuir aos sindicatos a defesa de direitos e interesses, se a solução dos conflitos continua a emanar do Estado.
Os sindicatos podem, cumprindo suas finalidades, criar instâncias conciliatórias sem qualquer atrelamento ao Estado, forma legítima e eficaz para extinguir pendências, coerente com os reclamos de modernização das relações trabalhistas.
Essa atuação sindical organizada, tendente à correção de distorções administrativas e à composição negociada, evitaria que aportassem na Justiça do Trabalho milhares de demandas, deixando para o Judiciário o exame das questões de direito, a garantir a ordem pública e o respeito à legislação de proteção dos trabalhadores, com qualidade e celeridade.
Daí, a idéia de extinção da representação classista, deslocando-a para sua real esfera de atuação.
Disseram, em defesa dos classistas, serem eles responsáveis pela conciliação de 50% dos processos e que o número não é maior em razão da interferência do juiz togado ("Folha de São Paulo, 13.03.94).
Fosse isso verdade indagaríamos com tal capacidade conciliatória, por que a resistência em deixar o Judiciário, onde o magistrado dificulta a conciliação? E quem está indevidamente na Justiça do Trabalho? O juiz togado, de carreira, ou o representante classista temporário?
O poder Judiciário tem por tarefa dizer o direito, cercando seus membros de garantias e vedações indispensáveis a que isso ocorra com independência e imparcialidade. Já o representante sindical tem o dever de defender interesses, o que é incompatível com a atividade jurisdicional.
Julgar ações trabalhistas e defender interesses de categorias profissionais ou econômicas são tarefas importantes para a sociedade, mas totalmente diversas. A aglutinação, por isso, tem sido ineficaz para responder com presteza à demanda de conflitos.
Pugnar pela extinção da representação classista é não só repudiar distorções a que se permitiu a Justiça do Trabalho mas, principalmente, reconhecer a importância da atividade sindical livre, sadia e desatrelada do Estado, por seus legítimos representantes, nos espaços adequados para tanto.
Não se trata de estabelecer o que é melhor para magistrados ou para classistas. Todos devem buscar o aperfeiçoamento que atenda aos interesses da sociedade.

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