São Paulo, domingo, 17 de julho de 1994
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Reunião quis fim da 'era da mendicância'

JOSÉ ROBERTO CAMPOS
EDITOR DE ECONOMIA

O sistema monetário mundial que emergiu do encontro de três semanas de mais de 700 delegados de 44 países, no Mount Washington Hotel, em Bretton Woods, no Estado de New Hampshire (EUA), sobreviveu enquanto durou a hegemonia política, militar e econômica absoluta dos Estados Unidos.
No dia 15 de agosto de 1971, o presidente Richard Nixon, após reunir-se com seus assessores na residência de repouso de Camp David, anunciou que suspendera a conversibilidade do dólar em ouro –sobre a qual repousara a época de maior expansão e bem-estar da história do capitalismo.
Rondando as decisões de Camp David estavam inflação em alta, os estragos políticos e econômicos causados pela guerra no Vietnã, greves, a perda violenta de competitividade do parque industrial americano, um crônico déficit público e o primeiro déficit comercial do país desde 1893.
Terminara a era em que os EUA podiam ser "a vaca leiteira de todo o mundo".
Nova ordem
Presidida pelo mais influente economista do século 20, o britânico John Maynard Keynes, a conferência de Bretton Woods pretendia terminar com a "era da mendicância", segundo palavras do próprio Keynes –a sucessão desastrosa de guerras comerciais, protecionismo, desemprego, hiperinflações e miséria nas décadas de 20 e de 30.
Na platéia daquela que foi a maior reunião econômica mundial estavam os futuros ministros dos governos militares brasileiros Roberto Campos e Octavio Gouvêa de Bulhões, o economista Eugenio Gudin e o ministro da Fazenda de Getúlio Vargas, Artur de Souza Costa. O Brasil foi signatário do acordo do qual nasceram, em abril de 1946, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. A União Soviética também assinou o acordo, mas jamais o ratificou.
As estrelas de Bretton Woods foram Keynes, que combinava suas posições inovadoras com os interesses do falido império britânico, e um talentoso assessor do Tesouro americano, Harry Dexter White. Divergiram em pontos fundamentais e, no acordo final, prevaleceu a posição americana.
O raciocínio era que ao só emitirem suas moedas em função da quantidade de ouro que possuíam em seus bancos centrais, países que se vissem diante de um déficit em sua balança comercial (a diferença entre exportações e importações) apenas poderiam corrigir seus desequilíbrios por meio de um freio nas importações.
Ao perder reservas, os governos encolhiam na mesma proporção a quantidade de moeda em circulação ou, o que foi muito frequente, desvalorizavam unilateralmente suas divisas. O sistema de correção de uma economia sob o padrão-ouro era tão automático quanto seus efeitos: recessão e desemprego.
A arquitetura de Keynes previa uma instituição internacional para regular o fluxo econômico mundial. Seria criado um fundo com moeda própria, composto por divisas dos países membros, para socorrer países que tivessem problemas em seus balanços de pagamentos, evitando as atitudes discricionárias do sistema anterior.
Seriam permitidos saques automáticos nas reservas do fundo (para Keynes) para países que apresentassem "desequilíbrios fundamentais" na sua balança de pagamentos. Mas, ao se submeterem à tutela de um organismo internacional, as nações integrantes do acordo se comprometiam a obter aprovação para mudar o valor de sua moeda. Na prática, a manter suas taxas de câmbio fixas.
Keynes idealizou um fundo com amplos recursos e amplos poderes. O que os americanos acabaram fazendo foi bem diferente. Destruíram a idéia de saques automáticos, concordaram com recursos muito modestos, criaram uma série de exigências para saques e empréstimos e deram ao diretor-executivo de seu próprio país direito de veto.
Em 22 de julho de 1944, as principais nações do mundo saíram de Bretton Woods com um sistema dólar-ouro. O dólar seria livremente aceito com o compromisso de ser trocado por uma paridade fixa com o ouro –US$ 35 por onça (28,349 gramas).
As taxas de troca das moedas nacionais pelo dólar deveriam ser praticamente fixas (a variação permitida foi de 1%, para cima ou para baixo). Os bancos centrais dos países se comprometiam a comprar dólares caso a paridade estabelecida fosse ameaçada. O dólar substituía o ouro e tornava-se a verdadeira moeda mundial.

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