São Paulo, domingo, 17 de julho de 1994 |
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Livro põe crise italiana no divã
JUAN ARIAS
Enquanto trabalhou em silêncio, na sombra, foi respeitado, procurado e amado. Foi só quando decidiu levar a público –evidentemente sem dar nomes aos bois– o drama psicológico dos representantes dos italianos no Parlamento que a ira do poder caiu sobre Rocchini. Foi demitido. Ele então resolveu escrever suas experiências e analisar a crise política no livro "A Neurose do Poder". A obra foi elaborada com a ajuda do Centro de Estudos Psicossociais de Roma. "Se eu abandonar a política, o que será de mim? Que mais eu poderia fazer?", lhe dizia um deputado, deitado em seu divã, de olhos fechados e tremendo como uma criança. E acrescentava: "E imagine o senhor, doutor, que bastava eu dizer uma palavra para ter todo mundo a meus pés, tremendo". "Os deputados que viam o poder escapar de suas mãos vinham a mim como pássaros enlouquecidos que não sabiam nem onde estavam nem quem eram", conta Rocchini. Ele tentou resolver suas síndromes de narcisismo ferido, de onipotência em queda, procurando devolver a eles a paz perdida e ajudando-os a colocar os pés no chão. Assediado pelos jornalistas para que revelasse nomes e algum segredo de seus pacientes italianos, o psiquiatra, sempre sorrindo porém impassível, respondeu elegantemente: "De modo algum". Rocchini disse em entrevista que a doença psíquica dos políticos italianos advém do fato de terem concebido os partidos políticos como uma grande "mamma" toda-poderosa, que pensa em tudo, dá tudo a seus "filhos", desde que estes façam apenas o que ela manda; uma "mamma" que infunde o medo neles, como se dissesse: "O que seria de você sem mim?" Como prêmio pela fidelidade, disse Rocchini, o partido-mãe permitia ao político-filho fazer o que quisesse, "dando a ele a ilusão de ser onipotente e permitindo-lhe o luxo de olhar para os outros como se fosse superior a eles". O resultado disso: "Um deputado que passou pela humilhação de ser preso me confessou numa sessão psicanalítica: 'Na cadeia eu abri os olhos e compreendi que havia esquecido como é a vida real das pessoas e que nós também precisamos respeitar suas leis' ". Essa concepção de partido-mãe seria apenas fruto do clássico "mammismo" italiano? "Eu diria antes que é fruto dessa concepção de mãe mediterrânea (não apenas italiana) sempre choca, que oferece tudo desde que você não negue nada a ela". Agora que Rocchini foi expulso do Parlamento, um número cada vez maior de políticos e ex-políticos bate em sua porta, para que ele cure seus fantasmas de bonecos quebrados. Tradução de Clara Allain Texto Anterior: Medicina da Ásia causa um conflito de culturas Próximo Texto: Romênia tem 'cemitério feliz' Índice |
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