São Paulo, segunda-feira, 8 de agosto de 1994
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Uma boa cisão é melhor do que a inércia

JOÃO BOSCO LODI

Cisões são frequentes na segunda geração como bomba de efeito retardado pela divisão do patrimônio
Sistole e diástole são movimentos perceptíveis nas fases de vida da economia. Hoje, como nos anos 70, a perspectiva de estabilização favorece as fusões e aquisições.
No final dos anos 80 e início dos 90 tinha-se abandonado a estratégica de sinergia dos conglomerados em benefício das unidades de negócio separadas e compactas. Agora na metade da década volta a sinergia através das fusões e aquisições na perspectiva de uma nova fase de "milagre".
O modismo das fusões é incentivado pela publicidade dos intermediários interessados: bancos, firmas de auditoria, grandes consultorias, com os seus recentes departamentos de M&A. Quase ninguém ganha muita coisa com uma cisão que ficou com uma conotação pejorativa.
1. A difícil sinergia societária. A cisão liberta forças, resolve convivências insustentáveis e, quando preventiva, representa um ajuste inteligente entre sócios que não querem operar juntos. Pode até aumentar as forças de cada um separadamente. Como risco, tanto a cisão como a fusão podem reduzir o poder de barganha.
A fusão traz a entrada de novo sócio para evitar a concorrência autofágica e consolidar um acordo operacional já ensaiado. Mas o processo de decisão é penoso, mesmo com a unificação do comando e o afastamento de dirigentes anteriores. Com frequência nas fusões a soma de 2 mais 2 é igual a 3, até que a junção se transforme numa incorporação disfarçada.
2. Cisão é fenômeno pós-fundador. Cisões são frequentes por obra da segunda geração como bomba de efeito retardado pela divisão do patrimônio, pois sob a liderança forte do fundador não há cisões.
Entre sócios fundadores, muitos deles imigrantes congregados pelos muitos anos de luta, o relacionamento é confiante e sólido, o mesmo não acontecendo com os filhos, primos, genros e noras. A cisão é uma tentação perene em todos os grupos familiares. É a forma civilizada de separar um sócio molesto.
3. O segundo negócio. Ter um só ramo de negócio pode facilitar a venda, mas não a cisão. Às vezes uma marca poderosa é o empecilho da divisão. A tentação é mais forte para cindir quando o grupo já está em dois ramos ou tem duas unidades distintas. A presença de um segundo negócio até facilita a retirada de um ramo da família.
Por se tratar de lojas separadas e independentes ou tipos diferentes de estabelecimentos (Varejo/Atacado) ou regiões distintas, o setor de comércio facilita as cisões familiares, como está acontecendo. Mas o mesmo argumento não tem sido usado para cisões de bancos com diversas agências, devido à complexidade do escritório central. Para preparar uma futura cisão o melhor a fazer é começar uma nova divisão de negócios.
4. Diferentes vocações. A cisão pode ser facilitada quando um primeiro grupo de sócios é vocacionado para operar um tipo de negócio enquanto o segundo prefere administrar patrimônios e empreendimentos diferentes. Neste caso a separação dos imóveis e bens patrimoniais numa "holding" imobiliária facilita a troca de ações para o grupo retirante.
Há famílias que consideram uma quebra de discrição chamar especialistas de fora como facilitadores nesses estágios primitivos de negociações. Algumas tentativas internas de separação de patrimônios e de cisão acabam por desgastar as relações levando a uma decisão conjunta de venda para um terceiro.
5. O pós-cisão. Há grupos familiares crescendo mais depois de separados, reforçando o paradoxo de que a desunião faz a força. Mas a cisão também pode levar uma das metades a sucumbir ao longo dos anos seguintes se a liderança, a disposição para a luta e a capitalização não conseguirem superar os problemas pós-cisão.
Há grandes famílias deslizando silenciosamente para a cisão seja pela inexistência de um consenso para a coalisão, seja pela tentação de separar negócios onde ramos da família já assentaram as suas raízes. As ciências sociais como o direito, a administração, a psicologia e a ciência-política oferecem instrumentos para a construção do consenso, mas ou não são competentemente aplicados ou capitulam diante de interesses maiores.
6. Alternativas para o desenlace. Na metade dos anos 90 e na iminência do novo cenário pós-eleitoral em 1995 as empresas brasileiras defrontam-se com alternativas societárias do seguinte tipo: a) exercício do direito de preferência e retirada de um grupo societário; b) cisão da sociedade; c) fusão com outro grupo; d) venda do controle para um terceiro; e) abertura do capital buscando um outro sócio; f) liquidação da empresa; g) take over hostil por parte de um dos sócios; h) continuar como está buscando negociar as divergências. Há também as alternativas administrativas: a) administração profissional com a separação entre gestores e proprietários; b) administração familiar, c) administração interina entregando temporariamente a gestão para uma equipe de fora até que se complete o saneamento. Dependendo de como seja a cisão, ela é melhor do que a inércia. Muitos, porém, preferem deixar como está para ver como é que fica.

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