São Paulo, segunda-feira, 15 de agosto de 1994
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Plano Real está à direita do FMI, diz Mangabeira

FERNANDO DE BARROS E SILVA
DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

O Plano Real não representa simplesmente a adesão do país às teses do chamado Consenso de Washington. O plano idealizado por Fernando Henrique Cardoso é uma heresia à direita da ortodoxia liberal formulada pelos técnicos do Banco Mundial e do FMI.
É isso que diz Roberto Mangabeira Unger, professor titular de direito na Universidade de Harvard (EUA) e principal ideólogo do presidenciável Leonel Brizola (PDT).
Com essa avaliação nada ortodoxa, Mangabeira, que acaba de voltar aos EUA depois de passar uma semana no Rio, assume uma postura de radicalização contra o programa de FHC. Seu discurso não encontra paralelos nem mesmo entre os economistas do PT.
O Consenso de Washington, segundo Mangabeira, proíbe por um lado a reindexação do capital financeiro e, por outro, enfatiza uma série de políticas sociais que visam compensar os custos do ajuste econômico sobre os mais pobres.
O que está fazendo a equipe econômica do governo? Segundo Mangabeira, a equipe "simplesmente sacrifica" as políticas sociais compensatórias.
"O Fundo Social de Emergência criado pelo governo está sendo usado para comprar títulos da dívida pública e ajudar a bancar a política de criação de reservas."
Além disso, prossegue Mangabeira, o governo teria incorrido numa segunda heresia, novamente à direita do consenso: "Com as taxas de juros elevadíssimas praticadas hoje, quem joga o seu dinheiro no mercado financeiro tem o seu capital indexado", diz.
Isto é, na avaliação de Mangabeira, os juros garantem não só a reposição da taxa inflacionária como um ganho real.
À luz desse quadro, argumenta Mangabeira, não faz o menor sentido que o PSDB gaste palavras para combater o Consenso de Washington tentando simplesmnete confundi-lo com um neoliberalismo vago, que teria na social-democracia sua alternativa política.
"O Bresser Pereira não entendeu nada sobre o Consenso quando diz que o neoliberalismo não é com eles", provoca o professor.
"As políticas compensatórias estão na página número um de todos os livrinhos do Banco Mundial e do FMI. Acho que ele não leu os documentos", completa.
O economista Luiz Carlos Bresser Pereira, coordenador financeiro da campanha de FHC, escreveu recentemente na Folha um artigo intitulado "O fim do triunfalismo neoliberal", em que fazia da social-democracia um antídoto às políticas de ajuste recomendadas pelo Consenso de Washington.
O neoliberalismo em estado puro, na avaliação de Mangabeira, não passa de um "discurso fantasioso" que não encontra adeptos nem mesmo entre os maiores entusiastas da cartilha de Washington.
"As únicas pessoas que ainda levam essa história de neoliberalismo a sério são economistas como o Eduardo Giannetti (da Fonseca), que fica na superfície das coisas atrás de rótulos ideológicos", provoca de novo Mangabeira.
Segundo ele, liberal por liberal, "quem quiser uma análise econômica mais aguda, um pensamento econômico consistente, deve ficar com o velho Delfim Netto, que pelo menos entende do que fala".

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