São Paulo, segunda-feira, 22 de agosto de 1994 |
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Autolatina muda estratégia para manter a liderança
ARTHUR PEREIRA FILHO
A partir de agora, os novos modelos lançados no país serão produzidos em plataformas mundiais, desenvolvidas pelas matrizes e usadas em diferentes países. A afirmação é do presidente da Autolatina, o engenheiro Pierre-Alain De Smedt, em entrevista à Folha. Smedt preside desde janeiro de 91 a holding que reúne Ford e Volkswagen. "O que valia para uma economia fechada, deve ser reavaliado em uma economia aberta", explica. Smedt diz que a empresa não tem planos para construir uma nova fábrica. A seguir os principais trechos da entrevistas: NOVA FÁBRICA A Autolatina no momento não está preparando uma nova fábrica. Fiquei muito surpreso com a notícia. O setor de business planning, responsável pela estratégia da empresa a longo prazo, começou a fazer um estudo da capacidade total da companhia. Esse tipo de planejamento é normal em uma grande empresa. É uma análise teórica. Muitas municípios já nos ligaram, interessados em ter uma nova fábrica da Autolatina e procurando saber se é verdade. Não é verdade. Nós não estamos perdendo mercado por falta de capacidade de produção. Quem precisa de nova fábrica é a concorrência. CAPACIDADE PRODUTIVA Não gosto de afirmar que a Autolatina tem uma capacidade de 800 mil veículos por ano, por exemplo. É muito relativo. Depende da organização de trabalho, do número de turnos. A fábrica de Taubaté, por exemplo, onde estamos produzindo o novo Gol, produzia cerca de 600 carros por dia. Agora, com algumas adaptações técnicas, e com o terceiro turno, vamos chegar a perto de 1.000 unidades/dia. CARRO "POPULAR" O carro popular está chegando a 50% do mercado. Em nenhum outro lugar do mundo existe a diferença de preços que existe no Brasil entre o carro popular e o básico. A diferença não está no produto, mas nos impostos existentes sobre o carro. Essa tributação é excessiva. Se não fosse isso, haveria uma divisão melhor na procura entre os carros populares e básicos. Com o sistema atual, o popular pode crescer mais, chegar a 50%, 55% ou até 60% do mercado. O NOVO CARRO DA FORD A tendência atual é de usar cada vez mais plataformas mundiais, quando temos que decidir a produção de um novo carro. É o que estamos fazendo no momento em nível da marca Ford. O Conselho Consultivo da Autolatina se reúne no final de setembro para tomar a decisão final. Provavelmente a melhor alternativa é o Fiesta. PLATAFORMA MUNDIAL O importante nessa discussão é a definição de uma estratégia para o futuro. Usar uma plataforma mundial faz sentido dentro de uma economia aberta como a do Brasil. O que era válido para uma economia fechada deve ser reavaliado em uma economia aberta. A nossa preocupação é ter duas redes de revendedores fortes e duas marcas fortes. MERCADO A perda de participação do mercado da Ford, nos últimos anos, de 22% para 12% ou 13%, é a consequência natural da evolução do carro popular, onde a participação da Ford estava extremamente limitada. A resposta para isso é entrar no mercado, com um carro pequeno, popular, usando uma plataforma mundial. A legislação do carro popular nos pegou em um momento em que nem a Volks, nem a Ford, nem a GM tinham um motor de 1.000 cilindradas. FUTURO DA AUTOLATINA O importante nessa discussão é a definição de uma estratégia para o futuro. A otimização de recursos atingida com a Autolatina se deu dentro de um mercado fechado. A criação da Autolatina, em 87, foi a melhor resposta para se conseguir redução de custos e racionalização da produção. Hoje, com o mercado aberto, temos que mudar a estratégia, para aproveitar a economia de escala não apenas em nível de América Latina, mas em nível mundial. Podemos continuar a usar os mesmos motores, as mesmas transmissões, partilhar o sistema administrativo, setor de compras, finanças, serviço jurídico etc. A economia de escala obtida nesses setores não deve ser descartada. A Autolatina vai trabalhar de uma outra maneira. Isso não significa que a empresa não faz sentido. RIVALIDADE FORD X VOLKS Temos funcionários com 20, 25 anos de trabalho na empresa. A Autolatina existe há sete anos. É normal que existam ciúmes, rivalidades. No nível dos revendedores, isso ainda é mais normal. São concorrentes. NOVO GOL O novo Gol será lançado no início de setembro em Munique, na Alemanha. A fábrica de Taubaté já está produzindo o carro. IMPORTADOS Há excesso de capacidade de dez milhões de unidades no mundo inteiro. Aquelas indústrias e países que não têm condições de vender nos mercados locais, têm uma tendência natural a fazer dumping para proteger os empregos. É só comparar o preço de alguns carros importados aqui no Brasil e o preço no mercado de origem. Não estou acusando ninguém, mas é fácil comparar. Isso não é abertura é ingenuidade, é destruir o emprego nacional. Numa economia global, é normal que não produzamos todos os produtos aqui. Mas quem importa, tem que exportar. O futuro governo terá que analisar a política industrial. LIDERANÇA DE MERCADO Há algum tempo meu amigo Hogan (Mark Hogan, presidente da General Motors) dizia que ia ser o líder de mercado. No mês passado estava com 18%, na terceira posição. Agora são meus amigos Pacifico (Pacifico Paoli, superintendente da Fiat Automóveis) e Silvano (Silvano Valentino, presidente da Fiat do Brasil) que garantem que a Fiat será a número um. Eu sou mais prudente. Prefiro não dizer se vamos atingir 60% ou 70% do mercado. PLANO REAL Estamos apoiando o Plano Real. A visão de que grandes empresas são favorecidas pela inflação é uma visão de muito curto prazo. O país precisa estabilidade, inflação baixa, regras estáveis. A concepção do plano é excelente, a aplicação me parece muito boa. Mas existem alguns riscos. O brasileiro sempre teve idéia de indexação de salário, de preço. Isso cria uma inércia, é perigoso. PRESSÕES SOBRE PREÇOS Estamos discutindo com trabalhadores e fornecedores. Os fornecedores dizem que os juros são muitos altos, o que é verdade, e serão obrigados a aumentar preços. Os trabalhadores alegam que em julho houve 6% de inflação e o salário precisa aumentar. Vamos sentar na mesa com todos os parceiros. Vamos dizer que não é o momento para aumentar o preço. Antigamente era simples. O salário subia, os fornecedores aumentavam os preços das peças, a montadora aumentava os preço das carros e tudo bem. Mas essa não é a maneira de combater a inflação .RESULTADOS Espero para 94 um resultado comparável ao de 93. Pouco mais de US$ 7 bilhões de de faturamento e lucro de US$ 377 milhões. O volume de vendas aumenta, mas vendemos carros pequenos, que têm margem de lucro menor. A Autolatina foi, desde 87, a empresa que investiu mais no país. Em produto e tecnologia. De 87 a 92, a Autolatina investiu US$ 2 bilhões. Ninguém chegou perto. Texto Anterior: Um personagem imemorial Próximo Texto: Indústria reconquista os EUA Índice |
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