São Paulo, segunda-feira, 22 de agosto de 1994
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Um personagem imemorial

LUÍS NASSIF

Curiosa figura, a deste ministro Rubens Ricupero. Seu conhecimento de história não se assemelha às superficialidades de seu antecessor, apropriadas para deslumbrar as mariposas que circunvoam os salões da intelectualidade chique, mas insuficiente para explicar os mistérios da formação do caráter nacional, identificar o barro em que foi plasmada a alma brasileira, para, a partir daí, preparar ações que pavimentem o caminho do futuro.
Em Ricupero parece habitar o conhecimento e a convicção dos que se sentem construtores de pátrias, levantando um edifício ou plantando um um único tijolo.
Sua figura ascética, o tom religioso de suas intervenções, o conhecimento crítico da história do país, fazem dele uma espécie de sábio intemporal. Como se sua presença discreta de funcionário público habitasse os palácios de governo desde a Regência, acumulando conhecimentos enquanto aguardava a hora de intervir.
Numa conversa franca com jornalistas, ao final do programa "Roda Viva" (que irá ao ar esta segunda), Ricupero teve a grandeza de admitir que seu projeto de país contemplaria medidas de alcance infinitamente mais largos do que esse Plano Real. "O Real não é condição suficiente nem sequer necessária para as reformas", admitiu Ricupero.
À visão ligeiríssima de seus auxiliares, que consideram que todos os atos econômicos são estimulados basicamente pelo egoísmo dos agentes econômicos, Ricupero contrapõe uma visão com toneladas de consistência a mais do que essa leitura estática de manuais econômicos –porque fundada na observação da história e da realidade.
A política econômica, para ele, é parte integrante e indissociável de um processo social. Só se consolida uma economia dentro de um processo de amadurecimento da cidadania, de estímulo à organização descentralizada, da modernização das cabeças, tudo dentro de um projeto de Nação que estimule a solidariedade, sem impedir a competição.
Dentro dessa visão, no cargo de ministro é mais importante o papel de educador do que a mera manipulação de números.
Decisões
Ricupero pretende apresentar ainda em outubro o conjunto de reformas institucionais. Crê ser possível votá-las após as eleições, quando as demandas eleitorais não estarão mais presentes.
Parece uma visão excessivamente otimista acerca do idealismo do Congresso. De qualquer modo, a iniciativa é importante por repor a discussão e permitir ao próximo presidente deslanchar nos primeiros cem dias. Ricupero atribuiu sua iniciativa a uma provocação do colunista, feita semanas atrás.
Em relação ao câmbio, o pacote fiscal de estímulo às exportações não é condizente com a política de câmbio flutuante adotada pelo Banco Central. Com os exportadores recebendo mais pelas exportações, o reflexo imediato será derrubar o preço do dólar mais ainda, anulando parte desses ganhos e estimulando ainda mais as importações. Ricupero informa que essa situação será contrabalançada pela adoção de cerca de dez medidas para estimular a demanda por dólares.

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