São Paulo, domingo, 11 de setembro de 1994
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Juros e longo prazo no mercado externo

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

A análise da taxa de juros, seja ela de curto ou de longo prazos, traz sempre indicações importantes sobre o que está para vir a ocorrer na economia. Como a taxa de juros é o aluguel que se paga por tomar recursos emprestados por um prazo, ela reflete as avaliações sobre o que se espera da economia no período vindouro.
Nos mercados internacionais, se um empréstimo ou uma aplicação financeira é de prazo inferior a 12 meses, essa aplicação é denominada de curto prazo; se é de um a cinco anos, é de médio prazo; se é de cinco a 30 anos, é de longo prazo. Nos Estados Unidos, por exemplo, cerca de um terço da poupança financeira é em ativos de longo prazo.
Note, caro leitor, que as aplicações de longo prazo não são uma raridade no mundo: só o são no nosso varonil Brasil. Mas parece que tem dirigente do Bacen que quer que isso continue assim (e invente fantasmas verbais para confundir as discussões na área)!
A taxa de juros de longo prazo é uma variável importante porque afeta as decisões de investir. Quando essa taxa de juros é menor que o lucro esperado em um projeto de formação de capital, o empresário, via de regra, decide-se a assumir os riscos do investimento e freqüentemente toma recursos emprestados para complementar o que é requerido para levar a cabo esse projeto.
Toda taxa de juros é composta de duas variáveis. Uma é o montante requerido para cobrir a inflação esperada no período do empréstimo; outra, é a taxa de retorno real da aplicação.
Quando as perspectivas são otimistas e o montante de investimentos grande e crescente, a taxa de juros real tende a subir pois há mais demanda por recursos de empréstimo. Quando a demanda por investimento está baixa, essa taxa costuma diminuir.
Aqui há um aspecto importante. A taxa real de longo prazo aumenta quando as perspectivas de crescimento são boas e a demanda por investimentos, elevada. Nas economias de mercado, as autoridades econômicas quase não têm meios de afetar essa taxa, que reflete forças reais da economia (isto é, são determinadas pelo jogo entre a oferta e a demanda por créditos, pelos planos das empresas e dos agentes de poupar e de investir).
Mas, as taxas nominais de juros também trazem embutido o que se espera que ocorra com a inflação no futuro. Para se poder separar a taxa de juros real da inflação esperada, precisamos ter alguma noção desta variável.
Bons indicadores de inflação esperada são difíceis, mas Robert Barro, da Universidade de Harvard (tido por muitos como o sucessor de Milton Friedman na análise monetária) tem uma alternativa interessante.
O gráfico do texto mostra dados anuais de um texto de Barro ("What the Fed can't do") com dados sobre a taxa de juros nominal das Obrigações de 30 anos do Tesouro americano, a taxa real sobre títulos pós-fixados de 30 anos do Banco da Inglaterra e a taxa de inflação esperada de longo prazo.
O retorno sobre os títulos ingleses mostrados no texto são retornos reais em adição à inflação, pois em meados dos anos 80 Banco da Inglaterra iniciou uma experiência com títulos indexados de 30 anos (atenção autoridades brasileiras, não são 30 dias).
Subtraindo a taxa nominal dos títulos americanos da taxa de juros real dos títulos ingleses tem-se uma idéia aproximada da expectativa de inflação de longo prazo (supondo que a taxa de retorno real dos Estados Unidos e Inglaterra sejam iguais).
Sabe-se que as flutuações na taxa de inflação esperada são muito maiores que as variações na taxa de retorno real e isso se reflete no gráfico. Assim, a queda da taxa de juros nominal nos títulos de 30 anos do Tesouro americano de 13% em 1984 para 8% em 1986 corresponde a uma queda da inflação esperada, fruto da dura política monetária posta em prática por Paul Volker.
No período recente houve um aumento da taxa de juros nominal dos títulos americanos de 30 anos: de 5,9% em outubro de 1993 para 7,6% em julho último. Tanto aumentou a taxa real de retorno requerida (de 3,2% para 3,9%) quanto a inflação de longo prazo (de 2,7% para 3,7%).
O aumento do retorno real indica que as perspectivas de crescimento da economia mundial são otimistas e os investimentos estão aumentando. Paralelamente, a inflação esperada para o restante da década não é tão elevada; é menor do que no início da década.
Esses dois dados têm uma implicação importante para a economia brasileira: vamos continuar a ter ingressos importantes de recursos estrangeiros no país tanto em 1994 como em 1995.
A pergunta a fazer, então, é como avaliar a política de juros real de curto prazo elevada do Brasil (e suas implicações sobre o mercado cambial) com este cenário internacional? Evidentemente, a política de juros está distorcida no país e, mais cedo ou mais tarde, terá que se conciliar com a realidade internacional.
ÁLVARO ANTONIO ZINI JR., 41, é professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP, autor do livro "Taxa de Câmbio e Política Cambial no Brasil" (Editora da USP). Atualmente é professor visitante na Universidade de Harvard (EUA).

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