São Paulo, domingo, 11 de setembro de 1994
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GM estimula criatividade e colhe qualidade

NELSON BLECHER

ENVOLVER OS FUNCIONÁRIOS
A preocupação com programas de qualidade na General Motors do Brasil começou em meados da década de 80, quando se tomou conhecimento das técnicas japonesas, inicialmente tratadas pela companhia como técnicas independentes.
Logo constatamos que não se podia aplicar uma técnica como o kanban, por exemplo, sem contar com um plano geral. Em 1986, a diretoria frequentou, nos EUA, um curso de Philip Crosby, guru dessa área de qualidade. Em seguida, Crosby veio ao Brasil e ministrou o curso para cem executivos.
Discutimos os conceitos para avaliar em que medida os conceitos se adaptavam à cultura brasileira e à cultura da GMB. Dois anos depois, desenvolvemos nosso programa PEQ (Processo de Educação para a Qualidade), com a ajuda de uma consultoria e teipes produzidos no Brasil. Almejávamos, então, a participação dos funcionários.
Os teipes mostravam situações reais, para demonstrar que a tendência das pessoas é ser permissiva desde que não seja afetado.
Foi o maior curso de treinamento que aplicamos na GMB, com duração de 30 horas e no qual investimos US$ 1 milhão. Em 1990, os quatro mil mensalistas e cerca de 15 mil horistas frequentaram o curso. DELEGAR RESPONSABILIDADES
Queríamos mudar a atitude geral. Até 1989 funcionava na GMB uma estrutura de controle da qualidade com uma diretoria própria. Por mais dinheiro que se gastasse, não havia como melhorar o nível de qualidade.
É uma questão cultural: se uma pessoa que realiza determinada tarefa e sabe que uma segunda vai inspecionar, tende a passar para a frente de qualquer jeito.
Chegamos à conclusão de que se alguém não está imbuído da responsabilidade de fazer algo direito acaba gerando uma cadeia de erros. O inverso também é verdadeiro. Mudamos a organização.
Transferimos o controle de qualidade dos fornecedores para a área de materiais. A aprovação de amostras ficou a cargo da área de engenharia. Isso tudo era centralizado na diretoria de controle de qualidade. Um produzia, outro fiscalizava. Gerava atritos.
Da antiga estrutura restou apenas um pequeno grupo encarregado de monitorar os processos e orientar sobre em que áreas aplicar mais ou menos recursos. INOVAR EM EQUIPAMENTOS
Operamos em três áreas básicas: produto, processo produtivo e pessoal. Nos últimos três, quatro anos a empresa passou a introduzir produtos mais modernos, em condições muito favoráveis, graças ao fato de que o pessoal de montagem de processo trabalha diretamente com o de produto.
Introduzimos novos processos de fabricação que favorecem a melhoria da qualidade.
No processo de produção em série o principal problema que o administrador enfrenta é manter a variabilidade sob um limite razoável. Eram usadas antes várias ferramentas para produzir uma única peça. A ferramenta única garante a padronização da peça.
O aspecto fundamental são as pessoas. Antes de 1989 os montadores somente conheciam o produto quando o carro já estava na linha de montagem. Agora são treinados e certificados com seis meses de antecedência.
O que visamos com isso? No passado, alguns consumidores não compravam os primeiros carros de uma série alegando que sempre apresentavam problemas. Agora o primeiro carro que sai da linha já possui classe mundial.
Adotamos na fábrica o sistema de "andon" (palavra japonesa que significa sinal). Se o operário suspeita de um problema puxa uma cordinha, que faz soar uma música e acender uma luz amarela. Todos os que estão nas proximidades correm para resolver o problema. CONTABILIZAR GANHOS
O PMC (Programa de Melhoria Contínua) vem sendo conduzido desde março de 1992. Através dele conseguimos reduzir 42 mil m2 de área total nas fábricas da GM.
Significa que não temos necessidade de construir novas áreas industriais. No caso de novos programas, utilizaremos as áreas obtidas a partir desse trabalho.
Em São José dos Campos "esvaziamos"uma fábrica de motores graças a um conjunto de ações: mudança na disposição das células de trabalho, eliminação de áreas de estoque e de retrabalho.
Gradativamente foi se limpando essas áreas que não adicionavam valor. É agora um espaço disponível para qualquer plano de expansão.
Registramos também economia de US$ 6,8 milhões no inventário (estoque de peças), graças à soma do trabalho das pequenas equipes.
A economia foi gerada porque se consegue colocar as peças na linha de produção na medida do necessário.
Um exemplo entre muitos: da fundição para a usinagem os estoques chegavam a dois meses. Hoje permanecem apenas oito horas. Os estoques entre a estamparia e a funilaria duram quatro horas. Chegavam a cinco ou até seis dias. Alguns painéis tinham estoques para quase 20 dias.
Estoques representam ativo imobilizado e também outros riscos para a qualidade. No caso da fundição, se determinada peça apresenta corrosidade, todo o volume estocado por um ou dois meses vira sucata.
O quarto e mais importante indicador refere-se à produtividade. Desde que o programa foi adotado, ela melhorou, em média, 37%. ESTIMULAR A CRIATIVIDADE
Como parte do programa estimulamos os operários ou equipes a encaminharem suas sugestões, que são recompensadas. Somente em 1994 recebemos 12 mil sugestões. O objetivo é chegar a dezembro com 23 mil.
Até o momento, elas já geraram economia de US$ 5 milhões -acreditamos que possa alcançar US$ 9,2 milhões.
A GM obteve economia brutal graças à recomendação de um funcionário sobre a dimensão de corte da chapa. Outro recebeu o prêmio máximo (de R$ 6.000) por ter sugerido a redução do plano de corte dos tecidos, que resultou em ganho de 10 a 20 cm por banco.
Graças à melhoria do processo, o número de pontos que precisavam ser retrabalhados na porta do Monza declinou de 71 para 53. SATISFAZER O CONSUMIDOR
O objetivo maior de uma empresa é atingir a satisfação do cliente. Quanto menor for o valor despendido em consertos do veículo em garantia, melhor será a qualidade do veículo.
Tomando por base o ano de 1990, essas despesas tiveram redução de 20% em 1992 e de 34,2% em 1993. Entre janeiro e outubro de 1993, a companhia melhorou em 56% o índice de qualidade interna.
Uma pesquisa de satisfação do cliente, conhecida por "new car buy service" e conduzida anualmente por uma consultoria externa contratada pelas três montadoras apontou a GM em primeiro lugar em 1993 –ocupava a quarta posição em 1990.
A simples satisfação do cliente não é mais a nossa meta principal. Queremos agora o entusiasmo do cliente. Qualquer deslize coloca o consumidor, automaticamente, na categoria "insatisfeito". Precisamos nos antecipar aos anseios dos compradores, superando suas expectativas. A premissa é válida também para os clientes internos.
Essa filosofia é aplicada na Saturn, nos EUA, a divisão mais nova e moderna da General Motors Corporation, e tem mostrado ser altamente positiva. Mas ainda precisamos trabalhar muito para chegar nesse estágio, tanto na área de produto como na de serviços. REFORÇAR A PARCERIA
A área de pós-vendas (peças e serviços) é quem persegue o entusiasmo do cliente. Isso se materializa na forma de suporte técnico e administrativo que prestamos à rede Chevrolet.
A mudança básica que introduzimos foi o PAQ (Processo de Aperfeiçoamento de Qualidade), destinada a aplicar a filosofia de qualidade da companhia à rede formada por 435 concessionárias e 19 oficinas autorizadas.
Desde 1991 já investimos US$ 1 milhão nesse programa. O PAQ ajudou os departamentos das concessionárias a resolver os problemas de forma integrada, como na fábrica.
A atual fase, iniciada em junho passado, diz respeito a processos de melhoria contínua, com aplicações práticas que vão desde economia de energia até modificações no layout da concessionária. Atualmente, 90% da rede já adota um novo padrão de identificação, desenvolvido no país a partir de pesquisas internacionais.

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