São Paulo, sexta-feira, 30 de setembro de 1994
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Diques

Desde 1992, as altíssimas taxas de juros fizeram das aplicações financeiras no Brasil um verdadeiro negócio da China. Europeus, norte-americanos e brasileiros com recursos no exterior vêm, desde então, se desfazendo de aplicações em dólares ou marcos para investir nos títulos do governo brasileiro. Bancos e grandes empresas instalados no país também começaram a tomar empréstimos no exterior para aplicar no generoso mercado financeiro nacional.
A intenção do governo federal de impor restrições às novas entradas de capital após as eleições desta segunda-feira indica que se espera a continuidade desse fluxo e que, provavelmente, pretende-se manter as taxas de juros elevadas.
Até julho passado, o câmbio era administrado –o valor do dólar vinha sendo diariamente corrigido pela inflação interna. Investidores externos vendiam cada vez mais dólares. E o Banco Central acumulava cada vez mais reservas.
Com a introdução do real, a indexação diária do câmbio foi substituída pela flutuação de mercado. O BC deixou de intervir sistematicamente, permitindo que oferta e demanda se ajustassem com maior liberdade. Como as taxas de juros continuam mais altas do que no exterior e a perspectiva de estabilização criou otimismo, a oferta de dólares prossegue superando a demanda, e seu preço cai.
Mesmo recebendo menos reais por dólar, a pressão de entrada de recursos continua forte –tendência que traz também algumas dificuldades. Deixar que a taxa de câmbio caia em demasia (o mercado tem interpretado R$ 0,85 como o piso) pode ter efeitos muito negativos para o setor exportador. Ademais, permitir que o nível de reservas internacionais continue crescendo indefinidamente pressionaria a expansão da quantidade de moeda ou forçaria o governo, para retirar reais da economia, a vender mais títulos, impedindo a queda dos juros.
A possibilidade de medidas restritivas à entrada de capitais resulta de que a queda da taxa de câmbio não estancou o interesse pela moeda nacional e, ao mesmo tempo, valorizar ainda mais o real pode ser contraproducente. O real caro não bastou para controlar o afluxo. Talvez seja necessário, ainda que temporariamente, construir alguns diques.

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