São Paulo, segunda-feira, 9 de janeiro de 1995
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Novo CD expõe contradições

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

O lançamento de "Mamouna", novo trabalho de Bryan Ferry, 49, coincide com o anúncio de sua vinda ao Brasil. Ele se apresenta em São Paulo nos dias 5, 6 e 7 de abril e no Rio de Janeiro no dia 9.
Ferry pertence a um panteão de ícones pop (como Lou Reed, Neil Young, Leonard Cohen) que, se já não cometem obras-primas indiscutíveis, conservam um grau de qualidade que os mantém livres do rótulo de "decadentes".
Escapa da pecha que não poupa outros cinquentões, como David Bowie, Bob Dylan, alguns Beatles e alguns Rolling Stones. Mas escapa por pouco.
"Mamouna" pertence à estirpe de discos solo autorais do ex-líder do Roxy Music, um dos expoentes máximos do rock setentista.
Aproxima-se assim dos discos comerciais dos anos 80, "Boys and Girls" (85) e "Bête Noire" (87). Afasta-se dos antológicos projetos do Roxy Music e das reinterpretações solo de clássicos soul e pop.
Aproximação e afastamento são relativos. A lista de músicos de "Mamouna" inclui três ex-integrantes do Roxy Music: Phil Manzanera, Andy McKay e Brian Eno.
O último é nada menos que o idealizador da banda, afastado de Ferry desde que a abandonou, em 73. Na época, Eno apelidou Ferry de "Frank Sinatra do rock".
As faixas de que ele participa, no entanto, são puro Ferry safra 80. Esbanjam romantismo com doses variáveis de açúcar, com clímax em "Which Way to Turn". A parceria inédita "Wildcat Days" frustra a expectativa do reencontro.
Momentos mais felizes são reservados ao encontro com a outra frente do pop anos 70. Nile Rodgers, majestade da discoteca e criador do grupo Chic, participa das consistentes "N.Y.C.", "The 39 Steps" e "Gemini Moon".
A faixa-título tem participação de David Williams, que já tocou com Michael Jackson e Madonna.
A sonoridade da palavra e a letra recheada de críticas ao hedonismo e alusões a passado e presente permitem alucinações sobre um melancólico e ambíguo recado a Madonna.
Williams toca também em "Your Painted Smile", momento sublime do disco. Repleta de dramaticidade, a faixa expõe o grande talento do Ferry versão 90: a interpretação, trabalhada primorosamente em "Taxi" , disco de 93.
"Taxi" nasceu de atritos do artista com a gravadora Virgin. Ele queria lançar "Horoscope", que a gravadora considerou anticomercial. Optou então por mais um disco de covers.
Aplacados os atritos, veio no final de 94 "Mamouna", e não "Horoscope". Tão comercial quanto os sucessos dos anos 90 e menos interessante que os impecáveis covers de "Taxi".
A organicidade do novo trabalho mantém distante o fantasma da decadência, mas suas contradições esboçam uma encruzilhada na carreira de Ferry. Ou em sua carreira na Virgin.

Disco: Mamouna
Autor: Bryan Ferry
Lançamento: EMI/Virgin
Preço: R$ 18 (o CD, em média)

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