São Paulo, sábado, 14 de janeiro de 1995
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O novo Brasil

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – No finalzinho da campanha eleitoral, quando ficou evidente a vitória de FHC, as trombetas começaram a soar, sopradas com entusiasmo. Seria o caso de o eleito pedir moderação aos entusiastas, mas ninguém foi mais entusiasta da própria vitória do que ele. Ninguém está soprando melhor a trombeta do que o novo presidente.
Uma vez empossado, seria natural que a zoeira baixasse. Mas o que estamos vendo é que as trombetas continuam, amplificadas pela mídia e pelos novos detentores do poder. E há um denominador comum no panelaço a favor –pois os panelaços foram feitos para serem contra alguma coisa.
Esse denominador comum garante que estamos num novo Brasil, que inauguramos uma Idade de Ouro, que os tucanos, com o abnegado reforço do Marco Maciel e do ACM, afinal descobriram o que nem Moisés conseguiu para o seu povo: o leite e o mel jorrando sem parar.
No entanto, nada mais velho e rotineiro do que esse novo Brasil trombetado. Apesar de suceder-se a si mesmo, o atual governo repete vícios e malefícios que foram inaugurados entre nós com a carta de Pero Vaz de Caminha.
Na semana que passou, o ministro da Cultura, de per si suficiente para provar que em matéria de carreirismo nada mudou no Brasil, demitiu o poeta Ferreira Gullar e o acadêmico Lêdo Ivo de dois cargos –ignoro de que escalões são a Funarte e a Casa de Ruy Barbosa, mas sei que os dois demitidos, além do prestígio intelectual que merecidamente desfrutam, não são incompetentes nem corruptos.
Foi o próprio FHC quem formulou os parâmetros para o preenchimento de cargos de nível médio. Um reconhecimento de que ele próprio, membro do governo Itamar Franco, beneficiário maior desse governo, não teria motivos para promover uma degola entre os antigos companheiros de poder.
Uma lástima que o Brasil não tenha realmente mudado. Nada mais velho do que o ministro da Cultura. Nada mais caquético do que fazer do serviço público um cabide de empregos e gratificações para os amigos e amigos dos amigos.

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