São Paulo, sábado, 14 de janeiro de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Competitividade espúria
VICENTE PAULO DA SILVA Nesse debate sobre as relações entre os encargos incidentes sobre a folha de salários e a competitividade externa do país, a primeira tarefa é separar o joio do trigo e estabelecer um entendimento prévio sobre os termos do debate.Na verdade, boa parte do que se chama genericamente de encargos sociais representa salário indireto: 13º salário, FGTS, férias, descanso semanal remunerado etc., que, somados, alcançam em média 48,25% do salário-base. Estamos falando aqui de conquistas básicas dos trabalhadores, que não podem ser encaradas como exageradas ou prejudiciais à competitividade. Elas existem em qualquer país do mundo, e no Brasil estão muito abaixo do que em outros países. A transformação de parte desses salários indiretos em salário direto não reduz em nada o custo das empresas. Aumentar a competitividade por esse caminho significa reduzir os salários e os direitos trabalhistas, e contra isso o nosso posicionamento é cristalino. Nossa luta sempre foi, e sempre será, pela ampliação desses direitos. Além disso, deve-se elevar, e muito, o poder de compra do salário-base, muito inferior ao vigente na maioria dos países, incluindo os mais competitivos. Quanto aos encargos sociais propriamente ditos (previdência, salário-educação e contribuição para acidentes de trabalho), representam apenas 24,5% da folha salarial, e também esse percentual é inferior aos padrões internacionais. Aqui, o mais importante é discutir como será garantido o financiamento (e o fortalecimento) da Previdência Social pública e dos demais direitos sociais e, nesse marco, verificar qual a base de incidência mais adequada. Isso tudo para dizer o seguinte: competitividade mesmo, para valer, depende de outras coisas. Depende do estabelecimento de regras estáveis para o funcionamento da economia; de taxas de juros que não inviabilizem o investimento produtivo; de políticas de investimento globais e setoriais; do aumento do gasto em educação, ciência, tecnologia, e pesquisa e desenvolvimento; da existência de infra-estrutura adequada; da qualidade dos produtos; do aumento da produtividade etc. Competitividade depende igualmente de condições de vida e de trabalho dignas para os trabalhadores, que estimulem a produção e a qualidade. A tradição no Brasil é de obtenção de "competitividade" de forma perversa e espúria, pela via dos salários baixos e das desvalorizações cambiais. Agora, em tempos de valorização cambial, propõe-se reduzir ainda mais os salários e os direitos dos trabalhadores para enfrentar a concorrência externa. Pelo jeito, muita gente no Brasil ainda confunde (ou quer confundir) aumento de competitividade com subdesenvolvimento e exclusão social. Acreditamos, ao contrário, que o Brasil só será competitivo se os ganhos forem de todos, e não só de uma parcela. Texto Anterior: A quebra da inércia medrosa Próximo Texto: Nomes aos bois Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |