São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 1995
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Biólogos revelam tipos sexuais

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Insetos que deixam sua vida sexual ser controlada por micróbios.
Fêmeas de uma espécie de peixe de aquário que não são tão virgens quanto se esperava.
E fêmeas dominantes em um bando de babuínos que tendem a ter mais e melhores filhotes –com um intervalo menor entre crias e bebês mais aptos–, mas sofrem mais casos de infertilidade e abortos espontâneos.
São três exemplos recentes de como o sexo ainda é algo difícil de ser entendido pela ciência, apesar de todos se encaixarem sem problemas maiores na teoria da evolução darwiniana. Três artigos científicos relatando essas descobertas foram publicados na revista científica britânica "Nature" do último dia 5.
O naturalista britânico Charles Darwin bolou sua teoria na metade do século passado, mas ela continua sendo cada vez mais aperfeiçoada.
As espécies, disse ele, evoluem através de algo que ele batizou de seleção natural, popularmente chamada de "a sobrevivência dos mais fortes" –ou melhor, dos mais "aptos".
Isto é, aqueles seres que conseguem sobreviver deixam mais descendentes que os que tendem a ser comidos por predadores, secados pelo sol, gelados pelo inverno ou de maneira geral destruídos por qualquer fenômeno natural.
Reproduzir-se e deixar filhos capazes de fazê-lo também é a medida evolutiva do sucesso.
É por isso que os biólogos acham que o grande objetivo de todo ser vivo e ter filhos e viver feliz para sempre. Os modernos sociobiólogos levam o racioínio adiante e inventam que os próprios genes –o material genético (hereditário) que constitui um ser vivo– é quem regula essa busca egoísta pela eternidade.
Como passar os genes adiante chama-se reprodução, e uma de suas formas é o popular sexo.
Como essa busca pela transmissão de genes tende a ser alucinada, há organismos que se aproveitam da "paixão" dos outros em proveito próprio.
É o caso de certos microorganismos que parasitam artrópodes, principalmente insetos. As bactérias da espécie Wolbachia pipientis praticamente controlam a vida sexual de bichos como o besouro-da-farinha, cujo nome científico, Tribolium confusum, já até dava uma dica para seu comportamento algo heterodoxo.
Michael Wade e Nancy Chang, da Universidade de Chicago, descobriram que a infecção do pequeno besouro pela bactéria aumenta a fertilidade dos machos, apesar de diminuir a fecundidade das fêmeas.
A maior fertilidade dos machos infectados com a bactéria tem, para ela, a vantagem de espalhá-la entre a população de besouros.
Um detalhe curioso da pesquisa de Wade e Chang é a própria anatomia da bactéria. Elas são uma espécie de fósseis vivos de uma organela das células, a mitocôndria, uma estrutura especializada que contém material genético, substâncias (enzimas) importantes para o metabolismo celular e a capacidade de produzir energia.
Apesar de toda essa importância, acredita-se que as mitocôndrias tenham surgido de parasitas, protobactérias que teriam "ficado em casa" e se adaptado à célula.
A bactéria Wolbachia pipientis certamente se adapotu aos insetos naquilo que se chama de "simbiose" –ou seja, a associação entre dois seres vivos diferentes que traz benefícios a ambos.
Por um mecanismo ainda não conhecido, disse Wade à Folha, as bactérias aumentam a fertilidade do inseto. O inseto macho consegue com isso passar mais os seus genes a outras gerações.
Saber mais sobre esse fenômeno não é mero voyeurismo direcionado à vida sexual de uma espécie mais primitiva. Bactérias como essa, as riquétsias, causam doenças em seres humanos como o tifo.
"Nós sabemos pouco sobre como elas agem nos seus hospedeiros naturais. Se nós compreendermos esses mecanismos então poderemos entender como elas causam doenças em seres humanos", declara Wade.

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