São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 1995
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O mico

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – O ministro do Trabalho, Paulo Paiva, faz uma análise técnica para demonstrar que o aumento do salário mínimo para R$ 100,00 é contraproducente.
Lista o já superusado argumento de que a Previdência não suportaria o rombo decorrente do novo salário, com reflexos inevitáveis nas contas públicas em geral. Acrescenta as dificuldades que muitas Prefeituras e alguns Estados teriam para saldar suas folhas de pagamentos com o mínimo a R$ 100,00.
E aponta ainda o fato de que o projeto aprovado prevê a indexação mensal do mínimo, o que vai na contramão do esforço do governo para desindexar a economia.
Não obstante, o ministro reconhece que o governo ficou em posição "desconfortável" ao ter que vetar o mínimo de R$ 100,00, ao mesmo tempo em que sanciona os reajustes salariais, muito mais suculentos, para seus próprios integrantes de primeiro escalão e para os parlamentares em geral.
Desconfortável é uma palavra fraca para designar o mico que caiu nas mãos do presidente da República. Não vai adiantar nada, aos olhos da opinião pública, o argumento técnico que Paulo Paiva esgrime (e que admite ser um "cálculo frio") de que o efeito nas contas públicas do novo salário do presidente, dos ministros e dos congressistas é infinitamente menor do que o de um mínimo a R$ 100,00.
É razoável supor que a maioria da população vai achar que o novo governo, como a maioria dos anteriores, estará praticando cenas explícitas de marajalato, com perdão do neologismo.
Mas o governo bem que merece o mico. O próprio presidente, ao ser informado da aprovação, em outubro, ainda em uma comissão da Câmara, do mínimo de R$ 100,00, antecipou o veto. Mas não mexeu um dedo para evitar ao menos a coincidência de votações do mínimo e dos salários dos grandes da República.
E, ainda por cima, prometeu durante a campanha elevar o mínimo a R$ 140,00. Alguém que não seja a velhinha de Taubaté vai acreditar que não dá para começar o governo com R$ 100,00?

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