São Paulo, segunda-feira, 23 de janeiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

América Latina fica mais dependente

ANDRÉ LAHÓZ
DA REDAÇÃO

Países como México, Argentina ou Brasil, que implementaram planos de estabilização da economia com ancoragem cambial, obtiveram um duplo resultado: de um lado, sucesso inegável no combate à inflação; de outro, dependência crescente dos fluxos de capitais externos.
O México é o melhor exemplo disso. O país teve, em 1987, uma taxa de inflação anual de 159%; o mesmo dado foi de 8% em 1993.
Mas, como a taxa de câmbio se desvalorizou menos do que a inflação, o plano produziu uma valorização do peso. Ou seja, o dólar ficou barato.
Esse fato, somado ao aquecimento inicial de demanda que o plano produziu, levou a um desequilíbrio na balança de comércio. As importação mexicanas passaram de US$ 19 bilhões em 1987 para US$ 65 bilhões em 1993. O déficit em conta corrente (balança comercial e de serviços) em 1994 foi de US$ 28 bilhões.
Esse desequilíbrio foi financiado por investimentos externos. E assim fecha-se o círculo: a queda da inflação é obtida com uma valorização do câmbio, que produz um desequilíbrio em conta corrente, por sua vez financiado com fluxos de capital.
Não há nada de errado em os países pobres receberem fluxos de investimentos externos. Afinal, os livros de economia ensinam que os capitais tendem a ir para os países nos quais são mais escassos.
O problema ocorre se esses países não conseguem usar esses capitais para produzir capacidade futura de pagamento.
Foi o que aconteceu no México. A maior parte dos capitais que ingressou no país não foi para investimentos diretos, mas para a bolsa de valores ou arbitragem de juros.
A crise mexicana ocorre quando esse fluxo de capital, vital para o financiamento do país, deixa de existir. Os sucessivos déficits (que deixaram os agentes em estado de alerta, prevendo uma desvalorização do câmbio) e crises políticas fizeram exatamente isso. Os investidores externos resolveram tirar seu dinheiro do país.
O fluxo de capitais então se inverteu. As reservas mexicanas ilustram esse fato claramente: passaram de US$ 23 bilhões no final de 1993 para apenas US$ 6 bilhões às vésperas da crise de dezembro.
A crise do México fez com que os capitais parassem de entrar na Argentina. Mas, até o momento, não houve uma fuga em massa do país, pois a avaliação é que a situação argentina é melhor do que a mexicana.
Uma fuga de dólares da Argentina colocaria o sistema bancário do país em extrema fragilidade.
Os bancos emprestam muito mais dinheiro do que têm. Se os agentes quiserem sacar seu dinheiro para tirá-lo do país, os bancos terão um problema de iliquidez.
Como o Banco Central argentino só pode gerar base monetária se tiver a contrapartida em dólares, ele terá duas opções: deixar que os bancos quebrem ou esquecer seu plano de conversibilidade. Qualquer uma das soluções é trágica.
Os capitais têm saído do Brasil nos últimos meses, mas nada que coloque o Plano Real em xeque. Os recentes resultados da balança comercial servem mais para indicar os limites da valorização do câmbio do que para criar uma crise de Balanço de Pagamentos.
Mas isso não quer dizer que o Brasil não enfrentará a mesma fragilidade de México e Argentina. A situação mais confortável do Brasil se deve, em grande parte, pelo fato de o plano estar no início, ao contrário dos outros dois países.
O teste do Plano Real se dará nos próximos meses. Se o Brasil conseguir atrair investimentos diretos, estará então criando condições para honrar compromissos futuros e fazendo crescer sua economia.
Mas se os fluxos de capital forem direcionados apenas para os mercados financeiros, estaremos então recriando o problema mexicano. Aí, é só esperar pela crise brasileira.

Texto Anterior: Campanha prega fim do banco
Próximo Texto: Diminui ritmo de investimento externo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.