São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 1995
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Quadrilhas da saúde

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Num hospital de Porto Alegre, em 1992, mulheres que tiveram filho tomaram injeções com antiinflamatório. O medicamento estava fraudado: era álcool puro. As pacientes morreram com infecção generalizada. Acompanhe, agora, o desfecho.
O próprio presidente da Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica, José Eduardo Bandeira de Mello, resolveu denunciar o remédio e o nome do laboratório. Passaram-se dois anos e simplesmente nada aconteceu. Ninguém foi punido.
Bandeira de Mello admite que casos desse tipo devem ocorrer com frequência no Brasil, mas quase ninguém sabe. Reclamar, enfatizou, não é um traço marcante do brasileiro. Para piorar, acrescentou, o governo não fiscaliza a produção de remédios.
Ele desferiu esses ataques ao ser informado que a Folha publicaria hoje uma lista oficial com remédios investigados em São Paulo em 1994. Encontraram-se até antibióticos fraudados, passando por creme vaginal com bactérias e medicamentos comprometidos para hemodiálise.
Raras vezes vi tanta sinceridade num dirigente empresarial. Apoiou a lista e defendeu a interdição de laboratórios. Afirmou que a maior parte das empresas são sérias, mas criticou: "Há quadrilhas de bandidos infiltradas no setor farmacêutico". Daí, por exemplo, a falsificação de medicamentos. Elas prosperam, acrescentou, porque "não há fiscalização, o descaso é generalizado".
Há, segundo eles, três tipos de quadrilhas: 1) empresários que produzem remédios sem nenhuma preocupação com a qualidade; 2) empresários que operam laboratórios clandestinos; 3) quadrilhas de verdade, envolvida no roubo ou contrabando de matéria-prima. Esse tipo de matéria-prima é a segunda causa de assaltado de cargas no Brasil.
Bandeira de Mello comentou que laboratórios de menor qualidade fazem negócios escusos com farmácias. Eles vendem 12 amostras e fornecem mais 12 de graça –o farmacêutico vê aí um "bom negócio" e empurra o remédio ao paciente.

PS – A propósito, um dos antibióticos em que se detectou problemas é ampecilina, abundantemente utilizado no tratamento de meningite.

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