São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 1995
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Dr. Alfonso Ortiz Tirado

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – A turma do governo e os jornalistas entusiastas com a situação estão se esbodegando para provar que o Brasil não é o México. São muitas as diferenças, garantem eles, a começar pelas reservas cambiais e a terminar na competência e seriedade de nossas autoridades.
Meio a contragosto, sou forçado a concordar com eles. Realmente, o Brasil não é o México. A primeira vez que ouvi a afirmação de que lá as coisas eram diferentes foi na infância.
Apareceu "por acá" um cantor que se apresentava no rádio e nos cassinos como dr. Alfonso Ortiz Tirado. Não me recordo se o cara era médico ou dentista, mas que era cantor, era. O José Lino Grunewald deve possuir ainda uns velhos 78 rotações com o seu vozeirão, um repertório feito naquela base.
Ora, nós tínhamos artistas que eram doutores. Mário Reis era advogado, Ary Barroso também, Joubert de Carvalho era médico. Nenhum deles se apresentava como "dr.".
Foi então que ouvi a explicação: "Lá no México é diferente". Acreditei e acredito até hoje. E as diferenças não ficavam apenas no dr. Alfonso Ortiz Tirado. Também aparecia por aqui, para fazer temporadas no Cassino da Urca, uma tal de Elvira Rios, de voz grave, diziam que era homem disfarçado em mulher, mas não por extravagância sexual e sim por estratégia profissional. Elvira seria agente secreta, não se sabia ao certo se a favor dos aliados ou contra, de qualquer forma era uma espiã.
Ora, a idéia de ter uma cantora popular metida nesses assuntos era causa de cívico estupor. Nós tínhamos Carmem e Aurora Miranda, Dircinha e Linda Batista, Aracy de Almeida. Como imaginar que uma delas se prestasse a papel tão degradante?
Novamente a explicação: o México é diferente, não é o Brasil. O que lá acontece não acontece aqui. Como se vê, ninguém deve ficar alarmado com o efeito Tequila. A atual hecatombe da economia mexicana deve ser coisa tão deles, tão exclusiva como o dr. Alfonso Ortiz Tirado.

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