São Paulo, domingo, 1 de outubro de 1995
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Mulheres vivem de mesada sem remorso

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Viver de mesada não é privilégio de adolescente classe média. Muitas mulheres que não trabalham -e costumam ``investir" em compras, viagens e lazer- recebem do marido (ou namorado) um fixo por mês.
Algumas delas sacam o dinheiro de uma conta conjunta, outras ganham um ``x" pela administração da casa (como se fossem ``secretárias domésticas") e um terceiro tipo divide a mesada entre os gastos domésticos e os pessoais (essas, às vezes, separam uma parte para colocar na poupança):
``Procuro reservar um pouco para fazer uma espécie de caixa dois", diz Renata Colucci, 37, 14 anos de casada, três filhos e uma mesada equivalente a 20% do faturamento do marido (empresário do ramo de diversões eletrônicas).
Estão descontados dessa mesada os salários das três empregadas, do motorista e dos dois guardas, mais os gastos com a educação dos filhos e a mesada deles. ``Meu marido se encarrega disso", diz.
Renata fica com a parte de supermercado, jardins da casa e lazer. O ``caixa dois" é para o caso de emergência. ``Vivo ouvindo histórias de maridos que deixam a mulher de uma hora para outra. Quando isso acontece, o dinheiro é muito mais do homem que da mulher. Ele sempre consegue provar na Justiça que não pode pagar a pensão", diz (leia texto ao lado).
A advogada Eliana Assaf da Fonseca, especialista em direito de família, diz que, se a mulher escolhe ficar em casa, é melhor se garantir mesmo. ``Na maior parte dos casos, as separações acarretam uma redução drástica no nível de vida das mulheres."
Se algum dia for deixada pelo marido, a dona-de-casa Adriana N., 31, oito anos de casada, tem certeza de que vai fazer falta. Ela diz que pode sair lesada, mas o marido vai se arrepender. ``Eu comando todo o dinheiro dele", diz.
Adriana é casada com um médico e deixou de trabalhar há oito anos, logo que seu primeiro filho nasceu (são dois). Para administrar a casa, as aplicações do marido no banco e o dinheiro que ele recebe dos convênios médicos, ela ganha uma espécie de ``salário", equivalente a 40% dos vencimentos dele.
``Nada mais justo", diz Adriana, que de dois em dois anos pesquisa preços e troca os carros da casa. Ela se define uma ``secretária doméstica".
Ser secretária do próprio marido é uma idéia que jamais passou pela cabeça da escultora Maria Clara Fernandes, 38. Ela prefere ser paparicada. Maria Clara foi casada durante 13 anos, separou-se há quase dois e desde então tem um namorado que ela classifica de ``muito generoso".
``Meu marido nunca fez por mim o que meu namorado faz", diz a escultora, que já conhecia o atual parceiro havia 20 anos.
``Quando meu casamento acabou, eu estava na maior dificuldade financeira. Ele me ofereceu o ombro e me deu uma força nas contas. Hoje, banca todas as minhas vontades. É um luxo: ele me abastece de roupas, paga o cabeleireiro e a ginástica", diz.
Quando precisa ir ao cabeleireiro (ou dar qualquer outro passo em direção ao consumo), Maria do Carmo David, 38, assina cheques sem pestanejar. Ela está casada há 15 anos, nunca trabalhou e não se preocupa muito com os gastos.
Maria do Carmo tem uma conta conjunta com o marido, controlada pelo escritório dele. ``Não tenho idéia do meu saldo no banco. Se passo um cheque mais abusivo, ligo para a secretária dele e comunico o valor", diz.
A maior parte das mulheres que vive de mesada, ou de conta conjunta, adora viajar. ``Levo cartão de crédito internacional e uma grana extra. Compro tudo que quero", diz Gisela Camargo, 36, casada há 12 anos. Ela diz que gosta de ``bater perna", fazer ginástica e não consegue se habituar a horários. ``Meu maior luxo é não precisar trabalhar."

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