São Paulo, domingo, 1 de outubro de 1995
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Abaixo o baixo astral

LUÍS NASSIF

Na análise dos rumos da economia brasileira, continua-se sem avaliação clara de relações de causa e efeito.
Em abril, o Banco Central tomou uma série de medidas de claro cunho recessivo que, conforme alertou a coluna, produziriam números recordes de falências, concordatas e inadimplência.
Mesmo assim, à falta de estatísticas iniciais claras sobre o tema, durante dois meses a mídia esbanjou otimismo, como se o iceberg que se aproximava não passasse de uma pedrinha de gelo.
Agora, tem-se o cenário oposto. O pior da crise já passou. Embora o Banco Central continue tímido na redução das taxas de juros, a cada dia que passa a economia se afasta do epicentro do terremoto.
Nesse período, houve quebradeira desnecessária, um amplo desperdício de energias, capital e trabalho. Muitos setores comprometeram por anos sua capacidade de endividamento.
Mas houve também ampla reestruturação das dívidas do setor privado e um trabalho reativo de empresas e pessoas físicas. Empresas se reorganizaram, foram vendidas ou quebraram e o fundo do poço já foi atingido.

Defasagens
O mal que podia ser feito já ocorreu. Assim como os indicadores não captaram de imediato a violência do processo, também não refletirão com rapidez a reversão do quadro. Durante semanas, as indústrias ainda continuarão despejando trabalhadores na rua e os índices de falências e concordatas se manterão altos. Mas são como edifícios com as estruturas abaladas, que vão ruir semanas depois do terremoto.
A partir de agora, a tendência será de uma recuperação gradativa da atividade econômica. Não tem mais terremotos pela frente. O BC já saiu de sua fortaleza impenetrável e tomou medidas de flexibilização do compulsório. Levará algum tempo para que o dinheiro possa fluir livremente e chegar até a atividade produtiva. Mas é questão de tempo.
O Ministério da Fazenda parece ter superado sua crise de paranóia de consumo, que o fazia comportar-se como o caçador pirado que se assustava até com cantos de passarinho. Até entendeu que consórcio é postergação de consumo.
Os sobreviventes do lado endividado da economia começarão a sair do sufoco. Daqui a algumas semanas, reduzido o volume do choro e ranger de dentes, aspectos positivos começarão a sobressair.
O ritmo de investimentos continua alto. A imagem do país lá fora está melhor do que nunca. Embora existam resistências, há razoável clareza sobre o rumo das reformas. Tem-se um presidente que, de vez em quando, sublima-se e esquece a realidade, mas que não abandonou o compromisso com as reformas e a estabilidade.
Enfim, o país está vivo, e não vão ser duas ou três barbeiragens na condução da política econômica que irão tirá-lo do caminho das reformas.

Lentidão
As reformas ainda estão em ritmo lento. Os ministros da Fazenda e do Planejamento têm que se dar conta de que, se não se estabelecerem prazos rígidos para seus projetos, vai-se levar uma eternidade até que saiam do papel.

Massacre
A falta de senso crítico na mídia está produzindo um massacre contra um homem de bem -o ministro da Saúde, Adib Jatene- e comprometendo um projeto fundamental -a municipalização da saúde.

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