São Paulo, domingo, 1 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Questão racial divide imprensa dos EUA

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Duas instituições do jornalismo norte-americano sediadas em Washington e com políticas editoriais parecidas estão em guerra.
O semanário ``The New Republic" publicou há duas semanas reportagem sobre as relações raciais na redação do diário ``The Washington Post".
Em resumo, o texto diz que a política de contratar jornalistas negros para dar maior representatividade a essa etnia na redação estava tornando a cobertura da administração da cidade pelo jornal menos crítica e mais condescendente. O prefeito de Washington é negro.
Além disso, a reportagem da ``New Republic" descreve o ambiente na redação do ``Post" como tenso, cheio de ressentimentos entre negros e brancos, que estariam insatisfeitos com essa política.
O ``Post" reagiu com virulência. Em entrevista à Folha, o secretário de redação Michael Getler disse que a reportagem, de Ruth Shalit, uma moça branca de 24 anos, é ``desonesta".
A ``New Republic" acusa o ``Post", que ajudou a derrubar Richard Nixon da Presidência dos EUA, de adotar ``fórmulas nixonianas de negação da verdade".
O ``Post" afirma que a ``New Republic", um dos primeiros veículos a acusar a campanha direitista de Joseph McCarthy no Senado, pratica ``macarthismo racial".
Donald Graham, editor do ``Post", afirma que a ``New Republic" nunca empregou um negro e que deveria adotar como lema a frase: ``Desde 1914 à procura de um negro qualificado".
Ruth Shalit, 24, branca, autora da reportagem, disse à Folha que não esperava uma reação tão intensa: ``Todo o mundo jornalístico em Washington sabe que a redação do Post é infeliz e tensa por causa dos problemas raciais".
Ela acha que sua reportagem, que lhe custou seis meses de trabalho, ``tocou um nervo, trouxe à superfície e ao público uma série de sentimentos ocultos".
Assim que a reportagem de Shalit foi publicada, o diretor de redação do ``Post", Leonard Downie Jr., convocou reunião aberta, à qual diz terem comparecido quase todos os 400 jornalistas baseados em Washington.
Toda a polêmica pode parecer corporativista e paroquial. Mas não é. Ela simboliza os enormes problemas que empresas e universidades enfrentam nos EUA devido à chamada política de ação afirmativa, que as induz a reproduzir em seus quadros a mesma divisão étnica da população.
O ``Post", que apóia a ação afirmativa em seus editoriais, tem atualmente 10% de negros em sua redação e tenta chegar a 32% de negros e hispânicos, o equivalente à participação dessas minorias na em Washington.
Segundo a reportagem de Shalit, muitos brancos na redação acham que vários de seus colegas negros não têm competência para ocuparem as posições que têm e se sentem prejudicados na política de promoção interna pelo fato de serem brancos.
Também de acordo com a reportagem, muitos negros do ``Post" dizem ser tratados de maneira paternalista e se sentem perseguidos por motivos raciais.

Texto Anterior: Brasileiro inova campanhas políticas
Próximo Texto: Jornal dá tratamento diferente a negros
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.