São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995
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Hélio Luz o tira-cabeça

LUIZ CAVERSAN

Desliga o telefone, vira-se para o repórter e diz: "Viu, eu tenho mãe. Embora não seja isso o que digam".
A mãe do delegado Hélio Tavares Luz, 49, chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, certamente vem sendo lembrada com frequência.
Assim como as mães dos juízes de futebol vivem nas bocas dos torcedores, a de Hélio Luz está em boa parte das rodinhas de conversa de delegados, investigadores e policiais em geral.
Desde que assumiu o posto há três meses com a disposição de criar uma "nova polícia" e revelar todas as mazelas da atual, ele tem colecionado inimigos.
Estilo heterodoxo
Com aparência nada ortodoxa, métodos insólitos e sem papas na língua, Hélio Luz pode até fracassar na sua cruzada contra o crime na cidade e a corrupta e ineficiente polícia local. Mas que está incomodando muita gente, isto está.
Luz tem sido bombardeado de todos os lados. Primeiro foi a esquerda, inconformada com um delegado "socialista" -que contribuiu com o programa de governo de Jorge Bittar, candidato derrotado do PT ao governo do Rio-, ter aceitado trabalhar com o secretário de Segurança do Estado, general da reserva Nilton Cerqueira, integrante ativo do regime militar (1964-1985), mais conhecido como o homem que matou o guerrilheiro Carlos Lamarca, em setembro de 1971.
Depois, foram seus próprios companheiros de trabalho, inconformados com frases do tipo:
"Não se trafica nada nessa cidade sem a conivência da polícia".
"Agora a Delegacia Anti-Sequestro não vai sequestrar mais".
"O Comando Vermelho é uma balela. Foi inventado pela própria polícia para justificar seus fracassos e sua ineficiência".
"Acho muito difícil um delegado não tomar conhecimento de atos de tortura que sejam praticados em sua delegacia".
"Os chefões do tráfico se acostumaram a pagar à polícia para não ser presos".
"Messias suicida"
As reações foram diversas. Desde ameaças de morte e xingamentos pelo rádio da polícia até manifestações de protesto na porta da Polícia Civil, passando pela palavra oficial do presidente da associação dos policiais, Carlos Eustáquio Pacheco: "Ele vive dizendo que todo policial é corrupto. Só ele não é".
Até o prefeito César Maia resolveu meter sua colher numa área que é de responsabilidade do governo do Estado. Criticou recentemente Hélio Luz por sua preocupação com os "direitos humanos", afirmando também que ele não está resolvendo o problema da criminalidade no Rio.
Numa atitude considerada por seus desafetos entre messiânica e suicida, com seu cabelo desgrenhado e ternos fora de moda, Luz vai em frente e aposta numa estratégia pelo menos bem definida: a renovação dos quadros de comando da polícia para combater a corrupção, a ineficiência e colocar o policial "a serviço do cidadão".
Suas "armas" estão sendo escolhidas dentre uma centena de jovens delegados, a maioria deles da última turma formada na Academia de Polícia. Os "golden boys" da nova polícia imaginada por Luz têm em média 30 anos, adotam métodos de procedimento policial modernos e se diferenciam dos demais policiais por detalhes como o visual "yuppie" e uma boa dose de carreirismo.
"São jovens com perspectivas de ascensão na carreira policial", afirma com ênfase. "Eles vêem que a direção da polícia está estimulando isso e estão ganhando terreno".
A reação, como era de se esperar, não foi nada boa. Os "golden boys", todos colocados em postos estratégicos da estrutura operacional da polícia, já são chamados pelos veteranos de "mariposas do Luz" (leia texto nesta página).
Sociólogo de esquerda
Hélio Luz fala da renovação da polícia como uma necessidade inadiável para reverter a escalada dos índices de criminalidade e discorre sobre a corrupção e a ineficiência com uma naturalidade espantosa.
Nestes momentos, parece um sociólogo de esquerda em divagações progressistas. Ou melhor: por causa dos cabelos e da barba longos, se assemelha a um estudante

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