São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

'Nunca fiz nada de que me arrependesse'

JOSÉ ARBEX JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

Folha - Quanto tempo levará, na sua avaliação, a fundação do Estado palestino?
Arafat - O Estado palestino já está sendo construído, já é uma realidade. De acordo com os prazos estipulados pelas negociações, a partir de 4 de maio de 1996 teremos que reavaliar os ritmos e prazos do processo de paz, incluindo a questão do estatuto de Jerusalém, os encaminhamentos sobre a presença dos colonos judeus na Cisjordânia, a volta dos palestinos espalhados pela diáspora e, certamente, o delineamento das fronteiras de nosso Estado. Lembre-se de que desde 28 de setembro a Palestina deixou de ser formada apenas pela faixa de Gaza e a pequena Jericó. Somos, agora, Gaza e a totalidade da Cisjordânia.
Folha - O sr. nunca foi assaltado pelo medo de que a morte o leve antes do nascimento do Estado palestino?
Arafat - Em primeiro lugar, você deve levar em conta o fato de que se Arafat morrer, a Palestina continuará existindo, mas sem os palestinos Arafat não é nada. Além disso, eu já voltei à Terra Santa, já estou vivendo no Estado palestino. O acordo de Taba (de 28 de setembro) foi a certidão de nascimento do Estado palestino. Ao que parece, você não está entendendo a dimensão daquilo que está acontecendo atualmente na Palestina. Você deveria visitar a região e ver as profundas transformações que estão ocorrendo diariamente na Cisjordânia e em Gaza.
Folha - Olhando para a sua própria vida, de que é que o sr. mais se arrepende? E o que lhe causa mais orgulho?
Arafat - Nunca fiz nada de que me arrependesse. Felizmente, eu me orgulho de muitas coisas. A mais importante é o elevado espírito de meu povo. Com esse espírito eles enfrentaram todas as dificuldades, os desafios, os massacres.
Folha - Como o casamento com Suha e o nascimento de Zahua mudaram sua vida?
Arafat - Eu só lamento não ter muito mais tempo para dedicar a Zahua e à minha família. Mas o meu casamento e o nascimento de Zahua contribuíram para formar uma falsa idéia de que só recentemente eu constituí família. Na verdade, eu sou pai de 28 filhos. São crianças que perderam seus pais nos massacres de Tal-al-Zaatar (no Líbano, em 1976) e de Sabra e Chatila (também no Líbano, em 1982), e a quem sempre procurei dedicar muito carinho, no limite de minhas possibilidades. Eu sempre tive uma grande família.
Folha - Em setembro de 1993, na cerimônia de assinatura dos acordos entre a OLP e Israel, em Washington, tornou-se visível ao mundo que o premiê israelense, Yitzhak Rabin, hesitou em apertar a sua mão. O que o sr. sentiu naquele momento?
Arafat - Eu estava tranquilo, porque sabia que as hesitações de Rabin não poderiam durar muito.
Folha - Durante a Guerra do Golfo, em 1991, o sr. apoiou Saddam Hussein. Como o sr. avalia hoje essa postura? Foi um acerto ou um erro inevitável?
Arafat - Vamos evitar interpretações equivocadas. Eu nunca apoiei a invasão do Kuait pelo Iraque, assim como nunca apoiei a intervenção de uma força multinacional contra um país árabe irmão. Você deve se lembrar de que lançamos uma iniciativa de paz logo após a invasão do Kuait, mas queríamos que fosse uma iniciativa no âmbito dos países árabes.
Achávamos que era possível encontrar uma solução árabe, fraternal para o conflito. A formação da força multinacional acabou atropelando e impossibilitando esse processo. Mas você deve se lembrar também, de que foi a nossa iniciativa diplomática junto a Saddam Hussein que permitiu a libertação dos reféns brasileiros no Iraque.
Folha - Que impressões o sr. leva de sua visita ao Brasil?
Arafat - As melhores possíveis. Fomos calorosamente recebidos pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e pelas lideranças do Brasil, um país que sempre se mostrou simpático à nossa causa. Embora nossa missão aqui não fosse a de concluir qualquer acordo, deixamos muito claro que pretendemos construir na Palestina uma sólida economia de mercado, aberta a investimentos.
( JAJr)

Texto Anterior: Arafat admite dividir Jerusalém com Israel
Próximo Texto: 'Nunca fiz nada de que me arrependesse'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.