São Paulo, domingo, 22 de outubro de 1995
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Seu filho já pensou em suicídio?

GILBERTO DIMENSTEIN

Reconheço que é péssimo lançar a pergunta do título acima, especialmente num domingo. Mas, se uma descoberta feita nos Estados Unidos servir para o Brasil, a resposta deveria ser "é provável" ou, pior, "muito provável". Suspeito que sirva, o que confirmaria dados ainda preliminares da Escola de Saúde Pública da USP sobre o comportamento de estudantes de 1º grau.
Depois de nove anos de estudos realizados por renomados psicólogos e pedagogos reunidos pela Carnegie Corporation, um relatório que acaba de ser lançado informa: um em cada três adolescentes norte-americanos entre 10 e 14 anos, independentemente de classe social ou raça, contemplou a possibilidade de suicídio.
Os estudiosos consideram que esses anos são a derradeira chance de reforçar valores e advertem que essa fase da vida não é compreendida. A tendência dos pais e professores, segundo o texto, é botar a culpa nos "efeitos hormonais" e, numa distância estratégica, deixar o turbilhão passar.
Por trás do comportamento agressivo, sempre disposto a desafiar, dizer não, o adolescente buscaria orientação. A distância dos pais apenas reforçaria sua angústia, num delicado período em que está mais disposto a se auto-afirmar, enfrentando perigos físicos.
Segundo o estudo, os professores, impondo mais disciplina, imaginam estar ajudando o aluno. Não avaliam que, na verdade, ele necessita de mais espaço e apoio para fazer suas escolhas positivas. Não significa atender às vontades ou dar cordas a maluquices, mas abrir espaço de transparência e administração dos conflitos.
Nunca se produziu, aqui, uma pesquisa tão profunda sobre essa faixa etária. Os resultados estão deixando preocupados os educadores, pais e homens públicos: educadores preocupados com seus alunos; pais, com seus filhos, e homens públicos, com a qualidade da mão-de-obra, que depende de refinado preparo educacional.
De acordo com o estudo, aumenta a tendência à depressão, em especial nas meninas, gerando um comportamento autodestrutivo. Daí a elevação da taxa de suicídio -de 1982 a 1992, ela cresceu 120%. Mais do que duplicou. Entre as meninas, o índice é maior ainda: 233%.
Apesar de todas as campanhas educativas, cresce o vício de drogas e o consumo de cigarro entre adolescentes. A cada ano o sexo se torna ainda mais precoce e sem proteção.
A pesquisa do Carnegie é aplicável ao Brasil por um motivo: as causas apontadas para o comportamento dos jovens daqui são abundantes também aí. A começar da mais importante delas: a desestruturação familiar.
A grande ênfase é na família, ou na falta dela. Cada vez menos o adolescente tem atenção dos pais. E cada vez mais ele está propenso a viver numa casa apenas com a mãe.

A privatização da Vale do Rio Doce é um dos grandes assuntos do meio financeiro dos Estados Unidos; até porque estão envolvidos os maiores bancos de investimentos. Eles garantem que conseguem vender a empresa em menos de 30 dias, tamanho o número de interessados. Calculam que o preço vá bater nos US$ 20 bilhões. A ver.

Notável como o direito do consumidor é levado a sério. O mais recente caso envolve a BMW, empresa que, aliás, mostra interesse em investir no Brasil. Um indivíduo comprou uma BMW e descobriu, dias depois, uma pequeníssima parte amassada, recoberta improvisadamente com tinta. O júri considerou aquela pintura uma fraude da fábrica. Estabeleceu US$ 4.000 de multa para que se fizesse o conserto. E mais US$ 4 milhões pela fraude. A fábrica recorreu, e a paulada ficou por "apenas" US$ 2 milhões.
PS - Aliás, fizeram aqui testes com essas cadeiras para bebês que se ajustam ao banco traseiro do automóvel. A maioria delas não resistiu à simulação da freada: o boneco se espatifava no banco da frente. A julgar pelo rigor técnico da indústria brasileira, sugiro que o teste seja feito aí.

Nas horas vagas, tenho me divertido montando um banco de dados com as previsões econômicas feitas para este ano -é certo que a economia não é uma ciência exata, mas também não precisavam exagerar. Na letra "A", está Mário Amato, que, em 29 de junho, disparou: "Já estamos em recessão, porque não acreditamos (os empresários), no dia de amanhã". Mais uma de suas frases: "Juros altos são incompatíveis com a queda da inflação". Na letra "C" está Joseph Couri, presidente do Sindicato das Microindústrias de São Paulo: "20% das pequenas indústrias vão quebrar".
Se eu estiver errado, por favor alguém me corrija: ninguém acertou a taxa de inflação tão baixa. Nem governo nem oposição.

O escritor Gore Vidal conta em seu novo livro que, em agosto de 1961, John Kennedy já previa um golpe no Brasil. Há série de documentos interessantes sobre esse período arquivados aqui. Um deles é a transcrição de um encontro secreto no Palácio da Alvorada entre Robert Kennedy, irmão do presidente, com João Goulart, testemunhado pelo então embaixador Lincoln Gordon -ele avisava sem meias palavras que viria chumbo, caso o governo não se livrasse dos "comunistas". Em outro documento Lincoln Gordon chegou a pedir armas a setores das Forças Armadas favoráveis aos Estados Unidos; pedi mais detalhes ao embaixador, ele disse que não se lembrava.

PS - Um dos motivos que me trouxeram aos Estados Unidos foi documentar o Projeto Axé, de Salvador, comparando-o com experiências educacionais de Nova York. A pesquisa vai tentar mostrar técnicas pedagógicas alternativas, baratas e eficientes, mostrando com um candidato a marginal se torna cidadão.

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