São Paulo, domingo, 22 de outubro de 1995
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Vírus adormecido

A primeira fase do Plano Real teve três características essenciais: a queda espetacular da inflação, a expansão extraordinária do consumo e o surgimento de preocupantes déficits no comércio exterior.
Entre março e julho deste ano o plano entrou numa segunda fase, de correções de rumo. Instaurou-se um novo regime cambial, anunciado como "de bandas". Apostou-se com firmeza no arrocho de crédito para conter o consumo. Cotas e aumentos de tarifas entraram em cena para estancar o déficit comercial.
Agora, pode-se dizer que o plano assumiu uma terceira personalidade, entrando em nova fase.
A inflação parece encontrar agora um patamar que se caracteriza pela "inércia". Hoje sem dúvida a economia está menos indexada. Mas nem o governo acredita que se possa levar a inflação dos cerca de 20% ao ano para algo próximo de um dígito nos próximos meses.
O próprio regime cambial agora dificulta a redução da inflação.
Desde junho a taxa de câmbio tem sofrido desvalorizações regulares. O sistema é de "bandas", mas as bandas não ficam paradas.
Ora, se o câmbio não é fixo nem valoriza-se como na primeira fase, os preços públicos devem ser corrigidos. Afinal, as estatais devem em dólar ou, como na Petrobrás, parte do insumo básico é importado.
O governo tem retardado as correções de tarifas, mas elas já começaram e continuarão. Anunciou-se também a manutenção de tarifas mais elevadas para os carros importados ao longo de 1996, contrariando declarações oficiais anteriores.
Seja pelo câmbio que se move, seja porque as tarifas serão corrigidas ou porque as taxas mais altas sobre importados terão vida mais longa, há por todos os lados sinais de que a inflação não poderá, num horizonte previsível, cair muito.
Não é a inércia da superindexação típica das inflações altas e crônicas, mas é um conjunto de fatores que têm o mesmo resultado: a cristalização de um patamar inflacionário difícil de se desmontar.
Nessa terceira fase a inflação é baixa, mas ainda é crônica. O vírus, adormecido, ainda está entre nós.

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