São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Economista diz que país treina para era fordista

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Metade dos trabalhadores brasileiros com mais de 25 anos (23,2 milhões) passaram menos de cinco anos na escola. E quase 20% estudaram menos de um ano.
A baixa escolaridade no Brasil é considerada uma armadilha que pode prender o país num círculo vicioso de desemprego, segundo avaliação do economista Edgard Alves, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Nos EUA, o desemprego atinge quase 10% dos trabalhadores com menos que o segundo grau completo e é de apenas 2,6% entre os formados em universidades.
O economista do Ipea afirma que o modelo de treinamento no Brasil está ultrapassado.
Ele critica as metodologias "obsoletas" de órgãos como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), que faz cursos com mais de dois milhões de trabalhadores/ano no país.
"Os cursos são rápidos, caros e baseados em modelos fordistas (em referência a Henry Ford, considerado o pioneiro da produção em série)", diz Alves. "Os trabalhadores sequer participam da idealização dos cursos, que só atendem ao que a indústria quer".
No caso do Senai, 80% dos trabalhadores que passam pelas 130 unidades no país recebem treinamento de 150 a 200 horas e apenas 20% têm cursos mais longos.
Segundo Alves, "na economia global, é preciso ensinar os trabalhadores a aprender, e não apenas a fazer". Isto possibilitaria mudanças no perfil da mão-de-obra sem a substituição (demissão) dos empregados menos qualificados.
Alves diz também que o governo deveria estar mais envolvido no processo de educação da mão-de-obra. Nos EUA, por exemplo, um empregador que contratar um funcionário com baixo nível de escolaridade e o mantiver por um ano, terá seis meses de treinamento pago pelo governo.
Centros de treinamento como o Senai foram criados há mais de 50 anos no Brasil, quando o país procurava substituir as importações.
"Quem diz que o modelo está obsoleto o faz por ignorância", diz Eloysio Rodrigues, assessor de relações externas do Senai. "A atualização é constante."
O orçamento anual do Senai soma cerca de R$ 480 milhões, gerados com base em uma contribuição de 1% da folha de pagamento da indústria. Mas 10% dos cursos de treinamento têm de ser pagos pelos próprios alunos ou empresas.
Na gestão do órgão, há sete representantes da indústria, quatro do governo e nenhum trabalhador.
"O Senai foi criado assim no passado e até agora ninguém questionou. O time está ganhando e pode dar errado se for modificado", diz Rodrigues.

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