São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Recurso natural não faz um país rico

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

O Brasil não vai conseguir dar um salto rumo ao desenvolvimento se não investir mais em educação, preparando o trabalhador para uma economia com tecnologias cada vez mais sofisticadas. A opinião não é de um pedagogo, mas de Gary Becker, professor de Chicago e Prêmio Nobel de Economia em 1992. "Recursos naturais não fazem um país rico", disse à Folha .
Por seus estudos sobre a importância do capital humano no desenvolvimento dos países, lançados na década de 30, Becker influenciou economistas do mundo inteiro, alterando o tradicional enfoque nas tecnologias, recursos naturais e obras de infra-estrutura como fatores essenciais ao progresso.
Ele também estende críticas aos Estados Unidos, onde as escolas públicas nos bairros pobres são, em sua opinião, insuficientes para produzir um trabalhador compatível com as novas exigências tecnológicas.

Folha - Durante muito tempo, os brasileiros diziam que "Deus era brasileiro", nossos abundantes recursos naturais seriam uma das provas. No futuro, o país seria uma nação rica. Qual o erro desse raciocínio?
Gary Becker - O investimento humano é mais importante do que as riquezas naturais. Veja países como Hong Kong, Japão ou Formosa, entre outros, que não têm riquezas naturais, e estão mais ricos do que o Brasil. Há poucos países no mundo que conseguiram enriquecer pelos seus recursos naturais. Basta ver quantas nações com petróleo têm ruins indicadores sociais. Coréia do Norte tem mais recursos naturais do que a Coréia do Sul, mas é bem mais pobre. Claro que os recursos naturais brasileiros podem ser úteis, mas não será um país desenvolvido por causa disso.
Folha - Como convencer em poucos palavras empresários e políticos brasileiros de que a educação é mais do que um assunto social?
Becker - É muito simples. O crescimento econômico está baseado no uso de novas tecnologias. Não se produz um trabalhador apto a lidar com as novas tecnologias, cada vez mais sofisticadas, sem uma base educacional também mais sofisticada. É impossível para o Brasil dar um salto para o desenvolvimento se não investir mais em educação. Há mais coisas necessárias, mas esta é indispensável.
Folha - Os americanos estão conscientes desse problemas e resolvendo suas carências?
Becker - Republicanos e democratas têm insistido na importância em investir em capital, em investir em educação e treinamento profissional. A consciência é grande, o que se reflete nos meios de comunicação.
Folha - Mas existem muitas críticas à qualidade da escola pública...
Becker - Há muitas categorias diferentes. No nível superior, vamos bem, somos o líder no mundo, e é por isso que muitos brasileiros vêm para cá estudar. No ensino intermediário, é bem diverso. Escolas básicas são de pior qualidade, destinadas aos mais pobres, o que é um grande problema.
Folha - Por que suas críticas às cotas que garantem a negros vagas nas universidades?
Becker - Acho melhor garantir um bom ensino básico aos negros e demais minorias. Isso significa melhor escolas públicas ou garantia que eles entrem numa boa escola privada. Defendo até que se dê um vale para que o garoto frequente uma escola privada.
Folha - No Brasil, se discute onde é melhor colocar o dinheiro público, se nas escolas básicas ou nas universidades. Qual sua opinião?
Becker - Quando fui ao Brasil, notei que a educação não estava entre as prioridades nacionais. Pelo que conheço do Brasil, acho que se deveria investir mais no ensino básico, onde as carências são maiores. E não apenas em educação básica, também enfatizaria a necessidade de investir no treinamento profissional de pessoas pobres e de classe média baixa.
Becker - Qual a habilidade que um estudante deve ter no mundo contemporâneo?
Becker - Deve ser íntimo na linguagem de computador, é uma sociedade baseada na tecnologia. Cada vez mais o mundo moderno está baseado na tecnologia de informação. Não manejar essa linguagem é como ser analfabeto. Além disso, o estudante deve estar preparado para a velocidade de mutação do conhecimento.

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