São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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O desafio empresarial

LUCIANO COUTINHO

Há uma questão chave quase sempre esquecida da lista de reformas e desafios para a retomada do desenvolvimento: trata-se da adequação do sistema empresarial frente a um cenário global acirradamente competitivo.
De saída é inescapável reconhecer que o sistema empresarial brasileiro -ressalvando-se grandes estatais e subsidiárias de transnacionais- ainda se encontra num estágio atrasado de concentração econômica e de profissionalização da gestão. O porte dos nossos "grandes" grupos econômicos é pequeno quando comparado ao dos países desenvolvidos e mesmo de países como Coréia e Taiwan.
Muito embora as empresas líderes sejam exportadoras eficientes (particularmente de commodities), infelizmente não dispõem de porte global, com capacidade relevante de produção, operação e penetração de mercados no exterior.
Mas, além da questão da escala empresarial, coloca-se o relativo atraso no processo de profissionalização da alta gestão. Ainda não se completou plenamente a separação entre propriedade e gestão.
A sobrevivência de grandes grupos vem sendo ameaçada por problemas sucessórios que podem ser evitados pela profissionalização.
Outra deficiência diz respeito ao provincianismo e à falta de visão estratégica -particularmente no que diz respeito às estratégias financeiras, de busca de sinergias e de capacitação tecnológica.
A longa crise dos anos 80 e da primeira metade dos 90, a terrível instabilidade com ameaça recorrente de hiperinflação, juros elevados e ausência de mecanismos longos de financiamento levaram a estrutura empresarial brasileira à prática persistente do desendividamento. Isso praticamente congelou a escala do sistema empresarial que dispunha apenas de recursos próprios para investir.
Simultaneamente, a falta de investimentos relevantes (salvo num número restrito de segmentos competitivos), o excesso de proteção e a falta de visão de longo prazo conduziram (com raras exceções) à fragilidade tecnológica.
Com a fixação da estabilização, a reflexão a respeito do perfil e da adequação do nosso sistema empresarial começa a ganhar importância. Vários grandes grupos já começaram a se posicionar, ainda que timidamente, como empresas globais. A tendência à profissionalização também deve ganhar força. A questão, porém, é se esse movimento ocorrerá com a velocidade suficiente para permitir o avanço e a captura de oportunidades num ambiente competitivo.
Talvez seja oportuno que uma política de desenvolvimento auxilie a expeditar esse processo, por meio do apoio às fusões, reestruturações e à criação de instrumentos de financiamento de longo prazo.

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