São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

México corre risco de nova crise econômica

FLAVIO CASTELLOTTI
DA CIDADE DO MÉXICO

A economia mexicana mostrou sinais de extrema fragilidade na última semana e revelou que o país não está a salvo de uma nova crise, semelhante à de dezembro passado.
Na quarta-feira, a Bolsa mexicana caiu 4%. Na quinta, o dólar avançou 8% com relação ao peso.
As consequências foram sentidas imediatamente em todos os mercados latino-americanos, em uma espécie de "efeito tequila parte dois".
A Bolsa paulista caiu 6,5% na quinta. A argentina, 3,3% e a chilena, 1,3%. Os títulos da dívida externa dos países latino-americanos perderam mais de dois pontos, em média, em Nova York.
Para a deputada Efigenia Martins, ex-diretora da Faculdade de Economia da Unam (Universidade Nacional Autônoma do México), a possibilidade de uma nova fuga de capitais, como a ocorrida em dezembro, não é nada remota.
"Só que desta vez as cifras seriam outras, já que praticamente tudo o que tinha para sair já saiu", disse ela à Folha.
Estima-se que, em dezembro, cerca de US$ 50 bilhões deixaram o país, quando o peso começou a despencar diante do dólar.
Há um mês, entre os dias 14 e 27 de dezembro, o México perdeu mais US$ 2 bilhões, que foram retirados devido à volatilidade do peso e da Bolsa verificada nessas duas semanas.
Para Martins, o ambiente é bastante propício para um novo estouro da economia mexicana, pois falta um projeto político-econômico claro por parte do governo e o setor real da economia está longe da anunciada recuperação.
A economista acredita que o peso vai continuar caindo e os juros, subindo, mesmo que de forma gradual, até que o governo decida tocar as causas reais do problema.
Nos últimos 35 dias, as taxas de juros subiram mais de dez pontos percentuais. Os Cetes a 28 dias -títulos do Tesouro que constituem a taxa líder- rendem agora 42,25% ao ano. A expectativa de inflação para os próximos 12 meses é de 22%.
Problemas
Martins cita o Nafta (Tratado de Livre Comércio da América do Norte, que une México, EUA e Canadá) como principal causa da fragilidade econômica mexicana.
"Foi um erro colocar o parque industrial mexicano em franca competição com o norte-americano e o canadense de um dia para o outro", argumenta ela.
Segundo Martins, há uma contradição intrínseca entre uma abertura econômica ampla (como a mexicana) e a política de câmbio flutuante, adotada pelo governo.
"Um câmbio estável é condição básica para uma abertura econômica sã", diz a economista.
No México, porém, a estabilidade da moeda ainda está longe de ser uma realidade. A cada problema político, os próprios mexicanos são os primeiros a correr às casas de câmbio.
Em 1994, sempre que os assassinatos políticos e a guerrilha em Chiapas ocupavam as primeiras páginas dos jornais, o dólar reagia imediatamente.
Desta vez não foi diferente. A prisão do comandante Germán, suposto líder do EZLN (Exército Zapatista de Liberação Nacional), e a possibilidade da retomada do conflito armado em Chiapas (sul do país) geraram um clima de grande intranquilidade nos investidores.
Por isso, Martins e a grande maioria dos mexicanos estão conscientes de que os abalos econômicos do país têm um fundo político.
"Apenas uma reforma profunda da estrutura política mexicana poderia dar maior estabilidade econômica ao país", argumenta Martins, referindo-se à "ditadura constitucional" em que vive o México. O país é governado há 66 anos pelo mesmo partido, o PRI (Partido Revolucionário Institucional).
Além da reforma política, Martins acredita que o México deveria rever suas relações com o exterior, adotar um mecanismo para regular as importações e renegociar vários pontos do Nafta.
"Não sou contrária à abertura, mas sim à maneira como ela foi efetuada no México", diz ela.
A deputada, porém, considera quase impossível que o atual governo efetue profundas reformas no campo de política externa.
Internamente, diz Martins, a alternativa do governo para tentar reverter o atual ambiente de incerteza seria lançar um novo programa econômico, que estimulasse a produção.
"O pacote lançado em março e vigente até hoje é recessivo e inflacionário", afirma a economista.
Ela considera que a crise iniciada em dezembro ainda está longe de terminar.

Texto Anterior: Para secretário, 'boatos' e peso derrubaram Bolsas
Próximo Texto: Boatos cercam ministro Cavallo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.