São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Os governadores contra o muro

DIAGNÓSTICO & RECEITA

OSIRIS LOPES FILHO

O ministro do Planejamento, José Serra, em programa da "TV Bandeirantes", na noite de segunda-feira, dia 23 deste mês, defendeu a tese da completa desoneração tributária das exportações brasileiras, eliminando-se a incidência do ICMS sobre os produtos primários e os semi-elaborados destinados ao exterior.
A sua fala foi tranquila, transmitindo a sensação de que se tratava da coisa mais natural deste mundo. Em suma, dizia ele, nenhum país exporta imposto.
Para propiciar competitividade dos seus produtos, no mercado externo, cada país procura eliminar a carga tributária incidente sobre os produtos exportados, de sorte que o seu preço de exportação esteja completamente limpo do componente tributário.
No Brasil, essa questão da tributação das exportações, historicamente, não é simples.
A partir do Ato Adicional, de 12 de agosto de 1834, que alterou a Constituição Imperial de 1824, com base no seu artigo 10, parágrafo 5º, as províncias foram autorizadas a criar o Imposto de Exportação.
Todavia, o conceito de exportação adquiriu significado amplíssimo, que vigorou por mais de um século. Entendeu-se por exportação a saída da mercadoria para fora do território da província e, posteriormente, do Estado.
Assim, a incidência do Imposto de Exportação dava-se tanto para mercadorias destinadas a terceiro país, como às dirigidas a outro Estado ou província do Brasil.
Apenas em 1944 conseguiu-se excluir da incidência do referido tributo as exportações internas. Daí que, prudentemente, a atual Constituição comete um pleonasmo, ao fixar a competência da União para instituir o "imposto de exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados.
O atraso do Brasil nessa matéria de tributação das exportações foi tão grande que, desde a Constituição de 1891 até a Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, todas as constituições republicanas estabeleceram a competência dos Estados para instituírem o Imposto de Exportação, embora com limites para a fixação das alíquotas.
A partir de 1965, mudou o tratamento tributário das exportações. Ao invés de tributar, a palavra de ordem foi desonerar de tributos e fornecer incentivos: imunidade do então ICM, isenção de créditos do IPI, isenções do Imposto de Renda.
Todos os embaraços à exportação, anteriormente citados, evidenciam que o problema central envolve as finanças estaduais.
A fórmula proposta pelo governo federal, no projeto de emenda constitucional de não-incidência do ICMS sobre as exportações de produtos primários e semi-elaborados, é frágil financeiramente.
Essa fórmula vai quebrar os Estados menos desenvolvidos. O Fundo de Compensação previsto é inseguro, insuficiente, precário para compensar as perdas arrecadatórias dos Estados.
O bom comportamento dos governadores é apenas aparente. Com a corda no pescoço, em face das dívidas estaduais perante o governo federal, não podem estrilar. Estão contra a parede.
Se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. Eis o dilema em que se encontra a continuidade da Federação.

OSIRIS DE AZEVEDO LOPES FILHO, 56, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro na Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário da Receita Federal.

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