São Paulo, domingo, 29 de outubro de 1995
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Vinhos franceses têm qualidade questionada

Le Monde
De Paris

PASCALE KRÉMER

Será que todos os vinhos franceses com certificado de origem (conhecidos como "vins d'appellation d'origine contrôlée", ou vinhos AOC) merecem essa prestigiosa distinção?
A revista mensal "Que Choisir?", em sua edição de novembro (nas bancas em 20 de outubro), questionou a garantia oferecida ao consumidor pelo certificado, e provocou um tumulto entre os produtores de vinho.
Na véspera da revista chegar às bancas, o Conselho Interprofissional de Vinhos de Bordeaux tentou, junto ao tribunal de grandes instâncias de Paris, suspender sua venda, mas fracassou.
O certificado da AOC, criado nos anos 30 para preservar a identidade dos melhores vinhos, é hoje, segundo a revista, um documento aviltado, que deixou de proteger os consumidores.
"Muitos produtores preferiram o dinheiro à autenticidade", avaliou a revista, pertencente ao órgão da União Federal dos Consumidores, reportando os resultados de testes gustativos realizados por grandes especialistas, que foram surpreendentes: alguns dos principais vinhos foram tomados por estrangeiros mais baratos.
"Nos últimos anos tem havido tanta especulação no mercado de bebida que o certificado de origem, reservado aos melhores vinhos, passou a ser concedido a produtores cada vez menos merecedores dele", diz o redator-chefe da revista, Pascal Seillier.
Segundo ele, o documento foi usado em vários casos para melhorar a imagem de vinhos medíocres, especialmente no mercado estrangeiro.
Hoje, 23 milhões de hectolitros de vinho são comercializados com o certificado AOC contra apenas 8 milhões de 30 anos atrás, e os vinhos com o certificado representam metade da produção francesa, em termos de volume.
É claro que os viticultores reagiram energicamente às acusações. Marc Jambon, vice-presidente do Birô Interprofissional de Vinhos da Borgonha, julga a pesquisa "tendenciosa e exagerada."
"Metade de nossa produção, que equivale a milhões de francos, é exportada. Vocês acham que todos esses clientes se satisfariam com porcaria?" Mas admitiu: "É claro que podem surgir problemas, como em toda produção humana."
Defendendo-se, os profissionais falam do longo percurso efetuado pelo vinho entre o momento em que recebe sua confirmação anual do AOC, junto ao viticultor, e o consumo final: engarrafamento, transporte, estocagem nas distribuidoras, exposição vertical às vezes por muito tempo sobre prateleiras muito iluminadas.
Às vezes há um intervalo de dois ou três anos entre os testes de qualidade realizados com os vinhos novos, e sua colocação no mercado. Nada garante que a bebida terá envelhecido como deve.
Um sinal de que os próprios viticultores estão conscientes da queda na qualidade dos vinhos é o fato de que o controle sobre os vinhos está sendo intensificado.
Em setembro, o ministro francês da Agricultura, Philippe Vasseur, decidiu aumentar os efetivos do Inao, órgão público de caráter administrativo, e os viticultores concordaram em pagar.
O Birô Interprofissional de Vinhos da Borgonha decidiu este ano começar a controlar os vinhos comprados de grandes áreas, coisa que já é praticada no Beaujolais.

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