São Paulo, domingo, 12 de novembro de 1995
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Traição

SÍLVIO LANCELLOTTI

O anúncio do sueco Lennart Johansson, presidente da Uefa, oficializando sua candidatura de oposição a João Havelange nas eleições da Fifa, em 98, deixou furioso o italiano Antonio Matarrese, vice de ambos nas duas entidades.
Claro que Matarrese admite a prioridade de Johansson na batalha pelo trono de Havelange. Apenas queria, porém, que o sueco se portasse com mais lisura, companheirismo e respeito. Três semanas atrás, depois de ser acusado de "desleal" por Havelange, na frente dos outros todos presidentes das confederações continentais, o sueco forçou um encontro secreto com o italiano para lhe pedir que se lançasse contra o brasileiro.
Bem escaldado pelas traições que sofrera às vésperas das eleições de 94, Matarrese pediu tempo a Johannson. Assegurou uma resposta até 11 de dezembro, quando o comitê executivo da Fifa se reúne em Paris. O sueco lhe prometeu não se mover enquanto Matarrese nada lhe dissesse.
Na última segunda-feira, porém, Johansson chocou Matarrese ao formalizar a sua intenção, dentro do executivo da Uefa, sem um aviso prévio ao italiano.
Um barês, meridional, de sangue particularmente inflamável, Matarrese cerrou os punhos e mordeu a língua, mas, ao menos, preservou a compostura.
Mas, depois do comitê da Uefa, explodiu sua irritação diante de alguns amigos e auxiliares. Por pouco não quebrou os seus óculos num lance de fúria, a pasta atirada repentinamente ao chão. Aos brados, afirmou já ter inúmeros problemas dentro da Itália, bem próxima à data das eleições da federação peninsular. "Traditore" foi a palavra mais branda que usou.
O episódio demonstra, novamente, a enorme incompetência política do sueco, um trator numa ourivesaria. Nos dias subsequentes, até se encerrar o encontro da Uefa, na quarta-feira, Matarrese permaneceu diplomaticamente impecável. A sua boa educação em público, contudo, não significa que o italiano se mostre tão plácido nos bastidores do mundo dos cartolas do futebol.
Matarrese exerce uma grande influência nas federações da África, sempre auxiliadas pela Velha Bota em suas necessidades, desde a cessão de técnicos na administração do futebol até mesmo o empréstimo eventual de dinheiro em casos de penúria.
Resumo da ópera: na sua truculência ambiciosa, Johansson, no mínimo, cometeu um erro grave. Mais um, numa coleção de tolices.

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