São Paulo, domingo, 12 de novembro de 1995
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Gordos e malucos

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - Cada sociedade tem suas imagens fatais. O brasileiro, por exemplo, é visto como um dos povos mais pelados da Terra. No exterior, a parte mais reluzente do país é a nádega.
Em decisão recente, a Embratur resolveu combater o estereótipo. Vai pôr fim aos cartazes que utilizam fornidos traseiros de brasileiras como isca para atrair turistas estrangeiros. O governo quer que o Brasil seja visto de outros ângulos.
A atmosfera de sensualidade esconde um país em guerra com a balança. Há uma batalha silenciosa contra a gordura. Bebe-se remédio para emagrecer como água da bica. Somos o éden da indústria do emagrecimento.
A última pesquisa catalogada no Ministério da Saúde registra: o consumo de anfetaminas, drogas para reduzir o apetite, cresceu de 7,7 toneladas em 88 para 23,6 toneladas em 92. Mantida a curva ascendente, serão mais de 60 toneladas em 96.
Os dados foram mencionados pelo secretário de Vigilância Sanitária da pasta da Saúde, Elisaldo Carlini, em seminário encerrado na sexta-feira. A ONU estima que pelo menos dois milhões de brasileiros estejam tomando diariamente remédios para emagrecer.
Esse tipo de medicamento gera dependência. A despeito disso, prolifera a automedicação. Só em 95, o Brasil deve importar 20 toneladas de anfetaminas. Um detalhe curioso, não mencionado por Carlini: quanto mais persegue a beleza corpórea, mais engorda o brasileiro.
Há entre nós 27 milhões de pessoas fora do seu peso normal, dos quais pelo menos 7 milhões são considerados obesos. De 76 a 91, o número de homens gordos inchou em 30%. Entre as mulheres, o percentual foi ainda maior: 43%.
É alto também o consumo de tranquilizantes. Estima-se que 2,6 milhões de brasileiros estejam consumindo calmantes diariamente. São remédios que só deveriam ser ingeridos em casos de ansiedade patológica. Ainda assim, por períodos curtos. No máximo quatro semanas.
Nesse ritmo, logo a Embratur devolverá às agências de turismo os cartazes que hoje abomina. Melhor que nos vejam como um país de bundas bonitas do que como uma terra de gordos amalucados.

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