São Paulo, segunda-feira, 4 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Defesa do Sivam vira doutrina militar

RUI NOGUEIRA
COORDENADOR DE PRODUÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As Forças Armadas fecharam um pacote de argumentos, com seis itens, para defender na reunião do Conselho de Defesa Nacional a manutenção do contrato do Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) com a empresa norte-americana Raytheon. Os argumentos misturam motivos técnicos e políticos.
Toda a argumentação militar converge para uma política coordenada pelo Emfa (Estado-Maior das Forças Armadas), que transformou a defesa da Amazônia e a tecnologia do Sivam nos dois pilares da doutrina de soberania nacional -substituta da doutrina de segurança nacional dos anos 60 e 70.
Exército, Aeronáutica e Marinha vêem nos investimentos do Sivam a grande chance das Forças Armadas se modernizarem do ponto de vista tecnológico. A defesa da Amazônia tem contornos paranóicos -os militares acreditam que ONGs (Organizações Não-Governamentais) e governos como o dos EUA têm interesse em internacionalizar a região.
Se o presidente Fernando Henrique Cardoso e a maioria do Conselho de Defesa Nacional tenderem a impor mudanças no contrato com a Raytheon, o último argumento dos militares será propor a criação de uma comissão composta por membros do Executivo e do Legislativo para rever o projeto do Sivam e fazer um relatório concluindo se há alguma irregularidade que justifique alterações.
Os membros das Forças Armadas no conselho -os ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica- vão iniciar a defesa do projeto e do contrato com a Raytheon alegando que seria jogar fora o trabalho de cinco anos da comissão do Sivam. Eles acham que começar tudo de novo equivaleria a adiar a implantação do projeto até, pelo menos, o ano 2000.
A defesa do contrato com a Raytheon tem outro argumento: além da multa da rescisão -o preço ainda teria de ser arbitrado-, o Banco do Brasil arcaria com a segunda multa de US$ 3,5 milhões pelo fato de o governo não ter ainda usado o dinheiro do financiamento de US$ 1,4 bilhão contratado junto a financiadores internacionais.
Em junho, o BB pagou a primeira multa no mesmo valor. Apesar dos riscos financeiros os militares não admitem que a oposição ao projeto argumente com o alto custo. Eles dirão que mais do que isso o governo já gastou no socorro ao sistema financeiro -só com o Banco Nacional foram usados R$ 2 bilhões em dinheiro público.
Os militares também vão aconselhar a não revisar o contrato do Sivam dizendo que isso poderia ser interpretado como uma submissão do governo às pressões das empresas que apresentaram propostas, mas foram preteridas. Isso, alegam os militares, abriria um precedente que colocaria sob suspeita futuras decisões.
Os centros de inteligência dos ministérios militares acham que por trás das denúncias contra o Sivam estaria a empresa francesa Thomson -ela concorreu com a Raytheon. A empresa francesa já negou qualquer ação anti-Sivam.
Os assessores parlamentares dos ministérios militares, que acompanham as discussões sobre o Sivam no Congresso, avaliam que é a pressão externa das empresas perdedoras -e dos novos interessados em aderir ao negócio de US$ 1,4 bilhão- que alimenta a ação dos partidos de oposição a FHC.
Sem encontrar uma prova forte o suficiente para justificar a abertura de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), esses partidos estariam vendo na crise do Sivam uma forma de acuar o governo -o que não conseguiram até agora durante toda a votação das reformas da Constituição.

Texto Anterior: Especialista defende uso de pesquisa no serviço público
Próximo Texto: FHC diz a secretário dos EUA que Sivam é uma questão interna
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.