São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
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O monumento e eu

MELINDA GARCIA

Fui alvo de prejuízos morais e intelectuais, desde que a encomenda da escultura homenageando o inesquecível Senna foi anunciada. "Artistas" e donos de galerias vociferaram contra mim, porque sou exemplo vivo de que um artista pode existir, de maneira íntegra, independente deles. Mas deram-me a oportunidade de mostrar que, se a minha arte "não é produtora de consciência", minha inteligência o é, ao denunciar a existência de grupos mafiosos que não medem esforços para salvaguardar sua falsa posição de especialistas (!) do assunto.
Comecemos por D. Regina Boni, dona de galeria; juntamente com o Sr. Baravelli (seu ex-amante e artista predileto), a utilizarem ambos o mesmo jargão -publicado na imprensa- :"tal obra não pode ser considerada arte". Ela aponta Amilcar de Castro o profissional para realizar pela metade do preço! Este deitou veneno, considerando minha realização "um insulto" ao nosso querido Ayrton. Meu senso estético também avalia suas obras insultuosas aos menos inteligentes: qualquer tampa de bueiro parece-me mais interessante do que seus ferros torcidos, coisa há 200 anos déjà vu.
As objurgações e intemperanças desse "trio maravilhoso" desencadearam reação profunda de desprezo e nojo, tal a pobreza de mentalidade a escamotear a mágoa gratuita, a inveja, despeito e menos-valia. Basta! Exijo respeito ao meu trabalho e à minha pessoa!
"Escultura para Senna não é Arte" -(diz Baravelli). Faz críticas sem nenhuma ligação com os objetivos inerentes ao monumento, vomita um texto inútil que por sua vez não produz consciência, um amontoado de pseudo-intelectualidade, ignorante e oportunista. Lança outra de suas frases de efeito: "Arte é produção de consciência". Diante de mentalidades desse jaez, justifica-se a lamentável situação das nossas artes.
Fique Baravelli sabendo que é a consciência que cria a arte, e não o inverso! A consciência é o resultado da convergência (unificação) mental -emocional, psicofísica. Desse processo de complexidade evolutiva ela emerge (eclode) numa realidade última. Só a consciência -portadora do self, quadridimensional- pode gerar arte dentro do absolutamente novo. Diferencia criador/artista, enquanto estes só trocam a roupagem de um conteúdo que já é velho. Nenhum artista "bom faria uma homenagem ao ídolo Ayrton Senna". Quem melhor poderia fazê-la, pergunto, se não o portador de consciência, o único realmente criador?
"Melinda está na dela, é uma sobrevivente"" - (Baravelli); "last but not... -ninguém conhece o trabalho da moça (Sra. Boni).... Respondem por estas os críticos covardes da mesma quadrilha que preferiram ficar omissos. Produzindo e expondo há 17 anos para Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Niterói e fora do Brasil, não sou assim tão desconhecida...
A física moderna nos ensina a não separar observador/observação; tagarelices unilaterais dirigidas a eles próprios, não a mim. Aliás, o cenário ideal para D. Regina exercitar militâncias é a cozinha, tal qual retratada por uma revista, umbigo encostado ao fogão.
Arte para mim não é mercadoria. Tão somente é suporte das minhas teorias, ferramentas de evolução. Imbuída desse espírito escrevi um livro sobre arte e nele introduzi o movimento que criei, holomovimento -e que breve lançarei. Por ora é o suficiente a declarar; pois não quero misturar as "estações".
Como escultora tive dupla missão: despertar um "símbolo" que, por sua vez, despertasse a "memória de Ayrton Senna", ao conjugar simplicidade e beleza, e registrar "Velocidade, Alma e Emoção". Cumprida essa síntese, o monumento passa à qualidade de obra de arte, já que o objeto da criação desse âmbito é "gerar símbolos". A cacarejos não darei mais atenção.
Declaro ter atingido meu objetivo, eis que a bandeira erguida simboliza a força criadora -a tremular no coração dos homens puros, a qual não se aprisiona ou domina; essa força que conduziu nosso saudoso Ayrton Senna ao topo do mundo é a mesma que me conduziu até aqui, ao coração do Ibirapuera!

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