São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
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Imagem da marca

FRANCESC PETIT
QUANTO VALE A IMAGEM DE UMA EMPRESA?

Tem-se falado muito do valor em dólares da imagem de algumas empresas famosas, produtoras de refrigerantes, computadores, cigarros, cervejas etc. São cifras que chegariam a US$ 40 bilhões -o que, sinceramente, acho um pouco exagerado, mas que sem dúvida podem ser muito altas, mesmo sem máquinas, fábricas, prédios, veículos, computadores...
Imagem se compõe de nome, logotipo e marca, arquitetura gráfica, comunicação coerente com essa imagem e linguagem específica, que impregna todos os atos e momentos em que o produto ou empresa atinge o consumidor, o fornecedor, o setor industrial, as autoridades do país e o sistema financeiro. A comunicação tem que ser homogênea; deve ser um todo, um pacote completo que todos recebam por igual, pois só assim se constrói uma sólida imagem.
O que ocorre é que, nos últimos 30 anos, deu-se pouca importância ao conceito de "marca". Empresários, publicitários e outros setores ficaram prestando mais atenção a fenômenos dos novos meios de comunicação e vendas, como TV, grandes promoções, patrocínios, marketing direto, informática...
Em todo esse processo, todos esses elementos tão novos e poderosos, tão caros e difíceis de manipular ocuparam as cabeças dos profissionais por quase três décadas, fazendo esquecer a tal da "imagem", abandonando em segundo ou terceiro plano todo o seu patrimônio visual.
E, como tudo na vida, é preciso cuidar da imagem como se fosse um passarinho ou um gatinho de estimação -só que, se você não der a ração ao gato todos os dias, ele foge e não volta mais.
Isso foi o que aconteceu com muitas marcas. Diversas empresas que tinham uma imagem excelente foram abandonadas, esquecidas ou, pior, irresponsavelmente trocadas por qualquer modismo ou tendência sem nenhum conteúdo -em geral, por pessoas ou profissionais pouco conscientes e desconhecedores da matéria.
Nos anos 50 e 60, uma invasão de renovadores assolou o mercado mundial. Vinham cheios de idéias da "gestalt e novos conceitos de marcas e logotipos, com teses nem sempre corretas, porém sábias, do professor Max Bill, fundador da escola de Ulm, na Alemanha.
Outros, como Vasarely e Casandre, fizeram trabalhos brilhantes para grandes marcas francesas, como Renault e Yves Saint-Laurent.
Nos EUA, o francês Raymond Loewy foi o pioneiro do design. Junto com Saul Bass e Paul Rand, introduzia novas imagens com grande talento e ousadia.
Mas a maioria dos casos nos EUA se transformou num apocalipse de assassinatos de grandes produtos, marcas, logos etc. O exemplo mais conhecido foi quando quiseram liquidar o logotipo da Ford em nome da modernidade, horror que durou vários anos e não pegou. Só com a bronca do patrão voltaram ao original, com a orientação e dedicação de Paul Rand.
Um exemplo de desperdício, de jogar um patrimônio fabuloso no lixo, foi o que a Varig fez com o "tucano", de minha autoria, que desde 1953 e por quase duas décadas foi a imagem da companhia. As pessoas se lembram do "tucano" até hoje; foi, sem dúvida, responsável pela imagem simpática e cordial dessa companhia aérea. No entanto, depois de manipular o personagem de maneira empírica e grosseira, jogaram um patrimônio incalculável no triturador da pia...
A maioria das grandes marcas -as mais poderosas- surgiu entre 1890 e 1940. Naquela época imperava um espírito mais aventureiro, mais heróico. Era o industrial impregnado de força e poder transcendentais; o dono. O senhor decidia tudo, ninguém se atrevia a dar palpites nem opiniões.
Por ser início de uma era industrial, nada existia em termos de comercialização em grande escala: nem técnicos em vendas, nem em distribuição, muito menos planejamento. Publicitários, nem pensar.
No fim do século 19 e início do século 20, havia uma promiscuidade saudável entre o artista e o industrial, banqueiro ou comerciante. Esses grandes empresários, misto de inventores intrépidos e colonizadores do mercado, usaram, como referência para criar marcas e produtos, o que um burguês abastado tinha mais perto: artistas, intelectuais, músicos, poetas, escritores, escultores, arquitetos e artesãos.
A "imagem" de marca surgia da inspiração do dono do negócio. Ele usava o talento do artista para criar aquilo, que para ele era impossível de imaginar, por mais comercial e prático que fosse.
Existia um refinamento e uma verdadeira criação, como se fosse uma obra de arte. Na época, predominava o espírito inventivo. Era preciso ser arrojado desde o cartaz, o logotipo, o personagem, até a própria fábrica.
A marca só existe se tiver um produto mais forte do que ela em si; a marca é o nome, é o apelido do personagem que é o produto. Eles têm que combinar, um nasceu para o outro. Alguém conseguiria um nome melhor para uma pílula contra dor de cabeça do que aspirina Bayer, ou uma lâmina chamada Gillette, ou um pneu chamado Firestone, ou uma vela de carro com o nome Champion? Até parece que primeiro existiu o nome e depois foi concebido o produto.
Talvez os empresários devessem prestar menos atenção à compra de jatinhos, computadores, máquinas etc., deixar essa tarefa para os técnicos e voltar a controlar a vida de suas marcas, produtos e derivados.

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