São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A VOLTA DO PUNK PAULISTA

RONALDO SOARES
DA REPORTAGEM LOCAL

O Olho Seco está de volta. Seis anos depois de sua dissolução, a banda paulista, que foi uma das pioneiras do punk rock no Brasil, prepara sua volta.
O novo disco de Olho Seco traz cinco faixas inéditas. As outras são regravações de sucessos punks da década de 80.
Mesmo as músicas novas são assinadas por colaboradores antigos, como Clemente (Inocentes) e João Gordo (Ratos de Porão).
Em entrevista à Folha, Fábio falou de seus planos para o Olho Seco. Casado, cabelos grisalhos e pai de uma menina de dois anos, o vocalista disse que a banda não terá "o compromisso de estar sempre fazendo shows e ensaiando".
Mas diz que mantém o mesmo espírito que o embalava no início dos anos 80, auge do punk no Brasil: "Sempre procuro me relacionar com os mais novos. O papo dos velhos é muito cabeça, sempre foi assim".

Folha - Como surgiu a idéia de retomar o Olho Seco?
Fábio - O Mingau sugeriu que nos reuníssemos. A idéia era gravar um material antigo como registro, dar um ou dois shows e parar. Mas a gente deve ficar fazendo um show ou outro de vez em quando, gravando quando tiver vontade.
Folha - O que você fez enquanto a banda esteve parada?
Fábio - Fiz várias coisas, trabalhei muito. Levei até saco de pano nas costas.
Folha - Qual a principal diferença do Olho Seco original para o novo Olho Seco?
Fábio - O som está mais bem trabalhado, está mais bem tocado e a gravação é melhor. Tem muita gente que não vai gostar.
Folha - A banda ainda tem uma proposta? E é a mesma de mais de 10 anos atrás?
Fábio - Sim, a proposta não mudou. As letras continuam metendo o pau no governo, porque o Brasil continua a mesma coisa.
Há 12 anos o Ratos de Porão cantava "A corrupção vai acabar com o Brasil" e isso vale para hoje ainda. Daqui a 10 anos, essas letras ainda vão estar atuais.
Folha - Você sente saudades dos anos 80?
Fábio - Nossa! Naquela época apareceu um pessoal novo, a coisa estava começando (o punk rock), tinha show todo final de semana.
Folha - Antes de o Sepultura fazer sucesso no exterior, vocês já eram cultuados em países como Finlândia, Suécia e Alemanha. Vocês ainda são lembrados por esse pessoal?
Fábio - Ainda hoje chega carta do exterior. Depois que uma música nossa foi incluída em uma coletânea que saiu na Europa, recebi tanta carta que deu para encher cinco caixas de papelão. Quando eu estava para casar, comecei a rasgá-las. Só que minha mulher viu e salvou duas caixas.
Folha - O punk-rock é um estilo rebelde e por isso costuma ser associado à juventude. Você se sente à vontade tocando numa banda punk aos 43 anos?
Fábio - Quando os Buzzcocks (grupo inglês, um dos pioneiros do punk na Europa) estiveram no Brasil, recentemente, uma menina perguntou para o guitarrista Pete Shelley alguma coisa relacionada à idade dele. Ele respondeu o seguinte: 'Os verdadeiros punks hoje estão de cabelos grisalhos'.
Meu espírito é: se tiver uma pá de gente conversando, vou procurar o pessoal mais novo.
Folha - O Olho Seco é comercialmente viável?
Fábio - Se fizer shows e lançar disco, vai ter gente querendo. Os caras mais novos nunca viram e têm a maior vontade de conhecer. Se bem que a gente não vai voltar com aquela obrigação de ter de tocar sempre.
Aqui é muito difícil ter banda. Lá fora, o cara tá dentro do mundo. Aqui, tá numa ilha cercado de buracos.
Folha - Há futuro para o punk rock?
Fábio - Enquanto houver bandas querendo soltar sua revolta pela música, sim.

Texto Anterior: Série de três livros traz testes de conhecimento para roqueiros
Próximo Texto: Mundo Livre começa a gravar segundo disco
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.